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- Rachmaninoff - Concerto para Piano Nº 4 - O Patinho Feio
Já tendo falado sobre os outros 3, detenho-me agora no 4º Concerto para Piano de Sergei Rachmaninoff. Ele definitivamente não é o mais gostado dos 4. O 1º é considerado um começo promissor; o 2º, a volta por cima (depois de um fiasco com a 1ª Sinfonia); e o 3º, a montanha, o Everest. O 4º é a ovelha negra. Ele foi considerado por muito tempo uma obra sem atrativos, com pouca fluidez, problemas de continuidade, temas pouco cativantes. Enfim, uma obra árida. Vamos já discordar. Composto em 1926, publicado em 1928 e, finalmente, revisado e republicado em 1941, o concerto teve poucas execuções por parte do próprio compositor, que se abatia facilmente com críticas e recebeu algumas nessa obra. A estreia teve uma reação fria. O público queria o famoso, velho e conhecido Rachmaninoff, mas ele lhes deu um Rachmaninoff Belle Époque, um tanto industrial, sofisticado. Só que ele realmente esqueceu de colocar um tema forte no primeiro movimento e no segundo. O terceiro também é um pouco confuso. Mas calma! Dito isto, bora defender a obra. Eu demorei a me apaixonar pelo 4º Concerto. Poucos pianistas o gravam individualmente: mas muitos o gravam quando querem lançar uma coleção com os 4 mais a Rapsódia Sobre um Tema de Paganini. De forma que ele foi muito gravado. Certamente mais de 50 vezes, sem contar gravações ao vivo. O pianista mais importante a gravá-lo solto, independente dos outros 3, foi Arturo Benedetti Michelangeli. O genial italiano, conhecido por ter um repertório não muito vasto e por se dedicar mesmo às obras que escolhia (eram poucas comparadas a outros pianistas, mas ainda eram em número considerável), nem tomou conhecimento dos 3 primeiros, mas defendia o 4º. Fez uma gravação maravilhosa, com a orquestra Philharmonia, regida por Ettore Gracis, que deve ser a mais perfeita. É considerada uma gravação de referência. No final deixo algumas sugestões de gravações. O Primeiro Movimento começa agitado, a melodia é apresentada pelo piano ecoado pelas madeiras em tremolo. O corne inglês apresenta um motivo importante, assim como a flauta. Mas o segundo tema também é do piano. São temas que, pelo menos pra mim, depois que você se acostuma, mostram sua beleza. O movimento é cheio de momentos que você tem que prestar atenção pra perceber que são notáveis. Quando a música entra na sua cabeça, aí toda a sua beleza vem em cada audição. De todos os concertos de Rachmaninoff, esse é o que retem mais a característica de cada vez que você escuta, mais ele se torna atraente. O Segundo Movimento é um Largo de beleza serena e nostálgica. O ponto culminante é lá pelos 5 minutos, quando ele vai crescendo e desemboca num momento tão sublime que é arrebatador. Pra ser justo, ele já tinha feito a mesma coisa num Étude-Tableau de 1911 que não foi publicado senão postumamente (o compositor morreu de câncer em 1943, aos 69 anos). É o Étude-Tableaux Op. 33, Nº 3, que vai escalando e tem o mesmo desfecho. O Terceiro Movimento é mais problemático. Destituído do momento de triunfo típico do compositor, como tão eloquente no Concerto Nº 2 e sublime no Nº 3, ficou ele um tanto sem propósito. Mas não que seja desinteressante. Era apenas questão de marketing, deixar uma bela explosão pra fechar a obra. Não o fazendo, manteve sua integridade (sua, pessoal, e do concerto), à custa do amor do público. Mas ouça o que eu estou dizendo: depois de se acostumar, você vai amar esse concerto, com curvas agudas e orquestração eficiente e muita beleza. Veja algumas opções de gravações: - Sergei Rachmaninoff, com a Orquestra de Filadélfia, regida por Eugene Ormandy; - Vladimir Ashkenazy, com a Orquestra do Concertgebouw de Amsterdã, sob a regência de Bernard Haitink; - Arturo B. Michelangeli, com a Orquestra Philharmonia, sob Ettore Gracis; - Tamás Vásáry, com a Sinfônica de Londres, sob Yuri Ahronovitch; - Alexander Ghindin, com a Filarmônica de Helsinki, sob Vladimir Ashkenazy (essa é a primeira gravação da primeira versão do concerto, a que se toca mais é a de 1941. O próprio Ashkenazy gosta mais dessa versão. Eu acho a última mais satisfatória.) Confira também nossas listas: O 1º e o 2º Concertos de Rachmaninoff O 3º Concerto de Rachmaninoff 10 Concertos para Piano 10 Sinfonias + 10 Sinfonias 10 Sonatas para Piano
- TOP 10 Obras sinfônicas extra categoria que você deve conhecer
Trago hoje a primeira lista de uma série de 3 ou 4 (quem sabe até mais) sobre peças sinfônicas que não se enquadram na categoria de Sinfonia ou de Concerto ou de Abertura. São alguns poemas sinfônicos, alguns balés e outras peças que realmente não se encaixam em nenhuma categoria. São ótimas pra quem quer começar no mundo da música erudita, simplesmente pegue qualquer uma, escute e deixe a mágica acontecer. Só lembrando que não está em ordem de nada. Nem cronológica. Edward Elgar (1857 - 1934) - Variações Enigma (Enigma Variations) (tema com variações) Edward Elgar foi um dos primeiros compositores ingleses depois do “grande hiato”. Acontece que a Inglaterra teve vários compositores extremamente relevantes, como John Dowland, Thomas Tallis, William Byrd, Orlando Gibbons, Henry Purcell, todos da Renascença (1400–1600) e do Barroco (1600–1750). Aí, claro que no classicismo e no romantismo houve compositores, mas nenhum alcançou fama internacional. Então veio Elgar (1857–1934), e a ele se sucedeu toda uma geração de compositores importantes, como Vaughan Williams, William Walton, Benjamin Britten e Gustav Holst. Foi uma espécie de retomada da Inglaterra ao cenário musical. Ele é um romântico tardio. A peça mais famosa de Elgar é a série de marchas Pompa e Circunstância (você deve conhecer como a música de formatura), sobretudo a primeira delas. Mas sua obra mais importante é as Variações Enigma, de 1899. É uma música teoricamente leve, que evoca características de amigos do compositor e situações que ele viveu com alguns deles. Mas, tentando fazer essa peça família, saiu uma música excepcionalmente universal, ainda que notoriamente inglesa. Os movimentos são geralmente nomeados com as iniciais desses amigos ou parentes. O nome “Enigma” vem do fato de a peça conter uma charada. Só que ninguém sabe o que é. Não se sabe nem o que é a pergunta, menos ainda a resposta. A teoria mais forte é que o tema, antes de qualquer variação, o tema bruto, seja um contraponto (uma melodia que, de maneira meio matemática, se encaixa com outra) de alguma melodia muito popular (na época). Mas nunca decifraram qual seria essa melodia. O próprio Elgar sugeriu que o Enigma é exatamente um contraponto, uma melodia que nunca aparece na música, mas está evidente entre cada variação. Como uma peça de teatro em que o personagem principal nunca aparece. Vale notar que ele jurava que iam decifrar o enigma desde a estréia, mas que, como isso não aconteceu, ele nunca disse o que era. Se eu sei a resposta? Não é óbvio? Gravações recomendadas: Orquestra Filarmônica de Bergen (Bergen Philharmonic), regente: Andrew Litton – Orquestra Sinfônica de Londres (London Symphony), regente: Adrian Boult Claude Debussy (1862 - 1918) - Prélude à l’Après-midi d’un Faune (poema sinfônico) O modernismo começou exatamente nessa peça. Não era mais romântica, tínhamos que dar outro nome. É raro que tenhamos uma obra de arte inaugural de toda uma era. Mas tá aqui. Fazendo uma analogia mais ou menos como escreveu o regente Julio Medaglia: Claude Debussy não pintou um quadro moderno. Ele pegou um quadro romântico e apagou, para que outros pintassem sobre. Ou seja, ele não fez nada realmente moderno, ele apenas evitou tudo que era romântico. A música é genial pelo que ela não faz, e não pelo que faz. Explico: a música tonal é baseada no acorde da dominante, que gera tensão, resolvendo no acorde da tônica, que gera relaxamento. A música ocidental se baseava nisso há 500 anos. Então, em 1894, vem o Prélude (traduz-se Prelúdio para a Tarde de um Fauno). Ele simplesmente nos dava acordes tensos e não resolvia. Isso é técnico, mas você pode escutar a peça e compreender que ela é vaga, flutuante. Não existe mais hierarquia entre os acordes. De tão suspensa, a música pode terminar em qualquer ponto. Debussy era um mágico da música. De tudo: orquestração, melodia, harmonia e ritmo. Essa música é tão incrível! Você ouve ora uma textura orquestral complexa, ora o som de um instrumento em destaque. A melodia principal é um cromatismo que desce e sobe e que é sempre repetido, mas nunca cansa. Esse tema parece acordar, no começo da música (na flauta), brincar e viajar bastante (nos seus 10 minutos, é ouvido 10 vezes) e, no fim, ficar preguiçoso de novo até dormir. Fantástico! Gravações recomendadas: Orquestra Filarmônica de Berlim (Berliner Philharmoniker), regente: Claudio Abbado – Orquestra Sinfônica de Londres (London Symphony), regente: Valery Gergiev Igor Stravinsky (1882 - 1971) - A Sagração da Primavera (The Rite of Spring; Le Sacre du Printemps) (balé) Falar da Sagração da Primavera não é fácil. Muito já foi dito. É, pra mim, a peça mais impressionante já composta. Fugidia, não serve pra dar aula de harmonia, pois depois que a gente descobre uns acordes octatônicos, esta passa a ser irrelevante; não serve pra dar aula de orquestração, porque qualquer coisa que você faça parecido com a Sagração será imitativo; estrutura, então! A peça não tem nenhuma lógica a não ser a história em que se baseia. Igor Stravinsky mesmo teve a ideia, que é bem simples. Uma tribo carece de uma boa colheita, e oferece à natureza, em troca, o sacrifício de uma jovem. Há um ritual, conduzido pelos velhos sábios, que prepara para a entrada das jovens. Elas hão de dançar até que uma delas caia duas vezes, tornando-se a eleita. Esta, então, dança em frenesi, literalmente, até a morte. O compositor ofereceu a ideia e a música a Sergei Diaghilev, dono dos Ballets Russes, uma das companhias de balé mais respeitadas da época. Ambos já tinham trabalhado juntos em O Pássaro de Fogo e Petrushka. Ele aceitou e, em 1913 houve o que é uma das estreias mais famosas da história. Tem livros e filmes inteiros sobre essa estréia. O cenário e o figurino eram de Nicholas Roerich, e a coreografia, do grande bailarino polonês Vaslav Nijinsky. A peça já começa com um fagote tocando acima do seu registro habitual. Metade do público aplaudia, mas a outra metade começou a vaiar insistentemente. Relatam-se brigas no teatro. Nijinsky, o coreógrafo, tinha que, na coxia, gritar o ritmo para os bailarinos, que já não ouviam a orquestra. Há quem diga que o motivo das vaias era a dança, não exatamente a música. Enquanto que, no balé clássico, o peito do pé se mantém à vista e as mãos e o rosto se fazem graciosos, no balé de Nijinsky, os pés ficavam pra fora, exibindo a sola; os braços faziam movimentos quadrados; os rostos tinham expressões diversas... Na primeira guerra a coreografia original se perdeu, então eles fizeram outra. Mais recentemente, alguns desenhos permitiram recriar o bailado inicial. O fato é que quase nunca o balé é encenado, mas a música é recorrente nas salas de concertos. Nenhuma obra do século XX é tão tocada e gravada. Dura cerca de 33 minutos. Existem gravações com Pierre Monteux, que regeu a orquestra na estreia, e pelo menos 4 com o próprio Stravinsky a reger. Gravações recomendadas: Orquestra Filarmônica de Los Angeles (LA Philharmonic Orchestra), regente: Esa-Pekka Salonen – Musica Aeterna, regente: Teodor Currentzis – Orquestra do Concertgebouw de Amsterdam (Concertgebouworkest), regente: Daniele Gatti Béla Bartók (1881 - 1945) – O Mandarim Miraculoso (The Miraculous Mandarin) (balé-pantomima) Béla Bartók, compositor húngaro, foi um dos mais importantes do século XX. Conhecido por seus 3 Concertos para Piano, a Música para Cordas, Percussão e Celesta, o Concerto para Orquestra e muito mais, tem também nesse balé uma de suas mais celebradas partituras. Como no caso de Stravinsky, a dança não é tão famosa quanto a própria música. Composto entre 1918 e 1924, constando de um ato só, foi, posteriormente, transformado em suíte de concerto, que é a forma pela qual é mais conhecido. Sua audição dura cerca de 16 minutos. A partitura é brilhante, empregando a orquestra de forma magistral. Tem uma hora, logo no começo, em que entra um som gravíssimo que, quando bem executado, tem um efeito sensacional. Gravações recomendadas: Orquestra Sinfônica de Detroit (Detroit Symphony), regente: Antal Dorati – Orquestra Sinfônica de Los Angeles (LA Philharmonic), regente: Esa-Pekka Salonen Heitor Villa-Lobos (1887 - 1959) – Uirapuru (poema sinfônico) Diz a lenda que se você ouvir o canto do uirapuru, pássaro raro e que só canta uma vez por ano, quando está fazendo o ninho para a parceira, você fica louco. Diz a lenda que Heitor Villa-Lobos visitou a Floresta Amazônica e que ouviu o piado do pássaro. Na verdade, Villa era um mentiroso compulsivo, e talvez nunca tenha sequer pisado na floresta. Ele mentia tanto que isso o fez cruzar o mundo, com histórias de como quase foi comido por canibais, de lendas que ouvira pelo nordeste do Brasil e tudo mais que ele imaginasse (ou que fosse verdade). Fato é que sua imaginação era tão grande pras histórias quanto pra música. A música orquestral de Villa-Lobos é tão imaginativa que, às vezes, chega a ser extravagante. Mas isso é raro. No geral ela é exuberante como a Floresta Amazônica. Uirapuru, de 1934, está entre as peças sinfônicas dele de que eu mais gosto. Foi gravada por grandes orquestras e grandes regentes, como Leopold Stokowski. Na partitura, ele usa um instrumento chamado violinofone, que é uma espécie de violino misturado com trompa. O som é de um violino distante. É mais uma peça fantástica nessa lista. Você se sente na floresta, Villa-Lobos era rei nisso! Sua audição dura 17 minutos. Gravações recomendadas: Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (OSESP), regente: Isaac Karabtchevsky – Orquestra Sinfônica da Paraíba, regente: Eleazar de Carvalho Steve Reich (*1936) – Variações para Cordas, Sopros e Teclados Lembro da minha mãe chegando em casa com esse disco e colocando na vitrola. Ainda tenho o vinil. Foi o meu primeiro contato com a música minimalista. Ela (minha mãe), como sempre, me explicou do que se tratava. Quem nunca teve contato, talvez pense que a música minimalista é calmíssima, zen. Na verdade, ela pode ser bem agitada, quase infernal. No caso dessa peça de Steve Reich, de 1980, os instrumentos não param, as madeiras têm que se alternar para pegar fôlego. Elas fazem uma base bem movimentada sobre a qual lentos acordes dos metais vão dando forma à obra. O resultado é primoroso. Na verdade, poucas peças minimalistas me chamam tanta atenção. Você tem aquele burburinho das madeiras, ou às vezes das cordas, e, do nada, surge um acorde cheio, bonito, nos metais, pra depois decrescer e morrer. A execução dura 21 minutos. Foi encomendada pela Sinfônica de São Francisco. Gravação recomendada: Orquestra Sinfônica de São Francisco (San Francisco Symphony), regente: Edo de Waart Richard Strauss (1864 - 1949) - Assim Falou Zarathustra (Also Sprach Zarathustra) (poema sinfônico) Inspirada no romance filosófico homônimo de Friedrich Nietszche, por sua vez inspirado na figura de Zoroastro, um filósofo persa do século VII A.C., é uma peça que eu escuto sem ter lido o livro. De 1896, é, como grande parte dos poemas sinfônicos de Richard Strauss, uma peça nem romântica nem moderna. O compositor o dividiu em 9 partes, mas são tocados quase sem interrupção. Ele abre com uma nota grave no órgão, no contrafagote e nos contrabaixos, sobre a qual logo ouvimos uma lenta fanfarra nos trompetes e dois abruptos acordes do restante da orquestra, seguidos pelo batucar dos tímpanos. Essa música é comumente associada à imagem de homens da caverna em triunfo. Isso porque Stanley Kubrick a usou em uma cena em que o homem descobre a arma (um tacape), em 2001: Uma Odisséia no Espaço. Esta obra também tem um enigma, mas este não é inerente a ela, e sim, a Nietszche. É o Enigma do Mundo. Algo sobre a verdade universal... O fato é que Strauss usa a relação entre o enigma e sua suposta resposta no final da música. Eu só sei que ele passa a música inteira alternando o acorde de dó maior com o de si maior. Aí, tem quem teorize que um representa o divino, e o outro, o humano. E quando a peça termina, não dá pra saber se foi em um acorde ou no outro. Eu não vou me alongar sobre esse assunto, porque se o fizer, vou escrever o dia inteiro. Mas, se a obra te parece complexa, vá lá e escute, que vai ver que ela é mesmo é bonita. Não confunda o Richard Strauss com os valsistas Joseph, Johann e Johann Strauss II. Estes compunham música de ocasião, para bailes, réveillons, enfim. O Richard era mais profundo (deu pra notar, né?). Assim Falou Zarathustra dura cerca de 30 minutos. Gravações recomendadas: Orquestra Filarmônica de Berlim (Berliner Philharmoniker), regente: Herbert von Karajan – Orquestra da Rádio Bávara (Bavarian Radio Orchestra), regente: Mariss Jansons – Orquestra Filarmônica de Viena (Wiener Philharmoniker), regente: Richard Strauss Aaron Copland (1900 - 1990) – Primavera nos Apalaches (Appalachian Spring) (balé e suíte de balé) O compositor Aaron Copland foi, durante muito tempo, considerado o mais importante dos Estados Unidos. Suas obras mais importantes são peças orquestrais, como a Fanfarra para um Homem Comum, o balé Billy the Kid, um belo e singelo Concerto para Clarinete e o balé Appalachian Spring, que depois foi transformado em uma suíte para orquestra. O balé original era para uma orquestra de câmara composta por 13 instrumentos. Já ouvi essa versão e ela funciona bem, mas a versão de concerto, para orquestra completa, me parece mais satisfatória. A versão do vídeo aí em cima é híbrida. É uma orquestra reduzida devido a uma tal pandemia. Composta em 1940, a obra se tornou lendária. Em 1945, Copland ganhou o Pulitzer de Música com ela. Como é uma suíte de balé, a obra tem uma estrutura menos sinfônica e mais rapsódica. Ou seja, é uma série de momentos encadeados um no outro em que um não tem, necessariamente, conexão com o anterior. Mas é belíssima, e extremamente americana. Não sei se eu saberia explicar o porquê de eu achar americana, mas quando você ouvir, vai identificar. Talvez o clima heroico, algo bélico. Nessa lista as obras pertencem todas a universos diferentes. Essa aqui, por exemplo, é única. Dura cerca de 25 minutos. Gravação sugerida: Orquestra Filarmônica de Nova Iorque (New York Philharmonic), regente: Leonard Bernstein – Orquestra Filarmônica de Los Angeles (LA Philharmonic), regente: Zubin Mehta Paul Dukas (1865 - 1935) – O Aprendiz de Feiticeiro (L’Apprentis Sorcier) (poema sinfônico) Este poema sinfônico de Paul Dukas, nomeado “Scherzo sobre uma balada de Goethe”, foi bem sucedido desde a sua gênese, em 1897. Mas seu sucesso maior, a inclusão no filme Fantasia de Walt Disney, o compositor, falecido 5 anos antes, em 1935, não veria. Desde então, o Scherzo (scherzos ou scherzi são peças com caráter vigoroso, ou jocoso, ou jovial), tem sido gravado por qualquer orquestra que tenha alguma discografia. É uma peça programática, em que um jovem aprendiz de feitiçaria toma escondido o chapéu do seu mentor sem ainda estar preparado para o poder que ele lhe dá. A orquestração é perfeita, uma pintura. Ele usa artifícios que só se tornariam comuns pelo menos 10-15 anos depois. Uma porção de pizzicatos, surdina nos trompetes, glissandos, cromatismos, simulações de poderes mágicos, água e até o assassinato de uma vassoura. Tudo isso já existia (se bem que acho que nunca se tinha simulado o assassinato de uma vassoura antes), claro, mas ele usou com uma propriedade absurda. E o mais impressionante é como a orquestra vai crescendo, enquanto o jovem mago vai perdendo gradualmente o controle do feitiço. Obra prima! Tem cerca de 10-11 minutos. Gravações sugeridas: Les Siécles, regente: François-Xavier Roth – Orquestra Sinfônica de Boston (Boston Symphony), regente: Charles Munch Modest Mussorgsky (1839 - 1881) – Quadros de Uma Exposição (Pictures at an Exhibition) Na verdade, Quadros de Uma Exposição é uma suíte para piano. Mas talvez seja mais conhecida na sua forma orquestrada por Maurice Ravel (1875 - 1937). São 10 “quadros” intercalados por variações de uma promenade (passeio). Vale dizer que Modest Mussorgsky seria um compositor praticamente desconhecido se Ravel não tivesse tomado a atitude de transcrever para orquestra, em 1922, essa peça, cujo original é de 1874. Mas, tendo-o feito, criou uma das obras mais executadas e gravadas do repertório sinfônico. Até a versão original para piano ganhou notoriedade, tornando-se uma espécie de showpiece para grandes pianistas, pois é extremamente bem escrita e virtuosística. A peça se baseia em alguns quadros do pintor, amigo de Mussorgsky, Viktor Hartmann, que falecera aos 39 anos, pouco antes. Admiradores de Hartmann organizaram então uma exposição com 400 quadros do artista. E, inspirado nos quadros, Mussorgsky compôs a peça. Os movimentos são: 1. “Promenade” (Passeio) 2. “Gnomus” (Gnomo) 3. “Promenade” (Passeio) 4. “Il Vecchio Castello” (O Velho Castelo) 5. “Promenade” (Passeio) 6. “Tuileries” (Tulherias) 7. “Bydlo” (Carro de Bois) 8. “Promenade” (Passeio) 9. “Ballet des Petits Poussins dans leurs Coques” (Balé dos Pintinhos em suas Cascas de Ovos) 10. “Samuel Goldenberg et Schmuyle” 11. ”Promenade” (Passeio) 12. ”Limoges, Le Marché” (O Mercado em Limoges) 13. “Catacombae, Sepulcrum Romanum” (Catacumbas, Sepulcro Romano) 14. “Cum Mortuis in Língua Mortua" (Com os Mortos em Língua Morta) 15. “La Cabane de Baba-Yaga sur de Pattes de Poule” (A Cabana de Baba-Yaga sobre Patas de Galinha) 16. “La Grande Porte de Kiev” (O Grande Portal de Kiev) Sempre me impressionei com “Gnomo”, “O Velho Castelo”, “Catacumbas”, “A Cabana de Baba-Yaga” e “O Grande Portal de Kiev”, além da originalidade com que, cada vez, ele apresenta a "Promenade". Em sua orquestração, Ravel emprega instrumentos de percussão com muita habilidade e bom gosto, já que no original não há nem sinal de onde caberia tal percussão. Em “O Velho Castelo”, Ravel deu a melodia a um saxofone, instrumento raro na orquestra. A lenda de “Baba-Yaga” é sobre uma feiticeira russa, às vezes boa e prestativa, outras, má, que mora numa cabana sobre pés de galinha. Nem todos os quadros sobreviveram, mas vou colocar alguns dos que ainda existem. Gravações recomendadas: Orquestra do Teatro Mariinsky (Mariinsky Orchestra), regente: Valery Gergiev – Orquestra Sinfônica de Chicago (Chicago Symphony), regente: Neeme Järvi
- Chopin - Os Estudos (Études) - Análise
Frédéric Chopin (1810-1849), pianista e compositor polonês do romantismo, gostava de escrever coisas em série - 1 livro de 24 Prelúdios, 4 Baladas, 4 Scherzi, muitas Valsas, Polinaises e Mazurkas. E ele nos deixou 2 livros de 12 Estudos cada. Na sua época era comum que professores de piano compusessem séries de estudos, na verdade, já era tradição. Eram peças sem graça, destinadas a exercitar cada parte da técnica do piano. O que Chopin fez foi colocar música nesse conceito. Seus Estudos são, acima de tudo, interessantes ao ouvinte. Aliás, não sei se acima de tudo, poruqe eles são bem difíceis, também. Funcionam como estudos, sim. Abordam quase tudo da mecânica de tocar piano. Mas são também, acho até que principalmente, peças de concerto. O Livro 1, Op. 10 O 1º Caderno é de 1833. Tem alguns dos Études mais famosos, que são o 3º, às vezes chamado de "Tristesse", e o 12º, chamado "Revolucionário". Mas todos são famosos. Esmiucemos. 1. Em Dó Maior- O primeiro é bombástico, embora dê a impressão de que o conjunto vai ser musicalmente besta. É que ele nada mais é que uma série de arpejos para a mão direita, com a esquerda fazendo uns baixos rudimentares. Mas lembrem-se, esses estudos são pro pianista se exibir. Veja abaixo. 2. Em Lá Menor - O segundo é uma peça dificílima. Ouvindo, parece fácil. Mas o cromatismo na mão direita é feito com só três dedos, porque ele ocupa (propositalmente) os outros dois com acordes em staccato. Em vários momentos você tem que passar um dedo por cima do outro. 3. Em Mi Maior - Esse é o mais lírico de todos. Chopin dizia que esta melodia era a mais bonita que compusera. O compositor nunca o chamou de Tristesse, mas o nome pegou. É um estudo de cantabile, que é adicionar um caráter de voz cantada, cheia de variações de dinâmica e tempo, ao piano. A parte central é completamente diferente, parecendo mais com uma peça de exibição. Mas logo volta a bela melodia. 4. Em Dó Sustenido Menor - É um estudo de velocidade, o que a gente chama de 5 dedos (sem truques, sem oitavas, terças, só agilidade, mesmo). O legal é que a mão esquerda tem tanta importância quanto a direita, muitas vezes a espelhando. 5. Sol Bemol Maior - É o Estudo das Teclas Pretas, porque as usa todas. Trabalha um padrão de dedilhado na mão direita, tocado muito rápido. É um dos mais famosos. 6. Mi Bemol Menor - Mais um lírico, ainda que triste. Trabalha a expressividade, bem como a extração de melodias escondidas. 7. Em Dó Maior - Um estudo um bocado difícil, a mão direita fica alternando entre terças e sextas de uma forma muito contraintuitiva. 8. Em Fá Maior - Adoro esse. É bem leve e iluminado, trabalhando arpejos na mão direita, conectando com a esquerda. 9. Em Fá Menor - Esse estudo é mais para a mão esquerda, trabalhando sua flexibilidade. Já foi usado até em uma esquete do Monty Python. 10. Lá Bemol Maior - Ele é um estudo geralzão. Trabalha expressividade (o compositor pede que a mesma figura seja tocada de todas as maneiras possíveis), pedal e polifonia (a capacidade de tocar mais de uma melodia simultaneamente). 11. Em Mi Bemol Maior - Esse é para o arpejo propriamente dito. O compositor escreve um acorde chapado e, ao lado dele, o símbolo do arpejo. Então toca-se aquele acorde de baixo pra cima, bem rápido - como se você estivesse tamborilando os dedos na mesa. 12. Em Dó Menor - O famoso "Revolucionário". Não foi Chopin que deu esse apelido. Aliás, nenhum deles foi dado pelo compositor, vindo, às vezes, até de detratores. Esse trabalha a mão esquerda, que faz arpejos e corridas pelo teclado. É um dos mais famosos, e não dá pra deixar de notar por que ele é chamado desse nome. O Livro 2, Op. 25 O 2º caderno foi publicado em 1837. Se o primeiro foi dedicado ao compositor e pianista húngaro Franz Liszt, este é para a sua amante, Marie D'agoult. Não vou entrar em detalhes porque não sou fofoqueiro. 1. Em Lá Bemol Maior - É chamado de "Harpa Eólica", que é um instrumento de cordas que se deixa tocar pelo vento. Trabalha um padrão de arpejos espelhados nas duas mãos. 2. Em Fá Menor - Também estuda velocidade e coordenação: a mão esquerda toca dois grupos de 3 notas e a direita toca quatro grupos de três notas - em quiálteras e ao mesmo tempo. 3. Em Fá Maior - É um estudo de movimento lateral das mãos, que têm que alternar rapidamente notas tocadas com os dedos centrais, com os dedos periféricos. 4. Em Lá Menor - Um estudo para saltos, na mão esquerda, e síncope, já que a melodia da direita está no contratempo. 5. Em Mi menor - O "Estudo da Nota Errada". Através de dissonâncias e síncopes, o compositor cria esse efeito - de que o pianista está sempre errando a nota ou o tempo dela. 6. Em Sol Sustenido Menor - Esse é o "Estudo das Terças Duplas". Surrealmente difícil, talvez o mais complicado de todos. Eu, há muito tempo, escutei uma gravação do grande pianista russo Josef Lhévinne e foi uma das ocasiões em que fiquei mais impressionado com um pianista (ainda mais dos anos 30). Ele toca com uma facilidade e aparentemente sem esforço. É mágico. 7. Em Dó Sustenido Menor - O mais longo dos estudos, nos dois livros. Chamado de "Cello", porque sua linda cantilena vem na mão esquerda, num registro que lembra o do violoncelo. 8. Em Ré Bemol Maior - Esse é um estudo de sextas. Muito difícil, porque se tocam sextas em sucessão em ambas mãos. 9. Em Sol Bemol Maior - Chamado de "Borboleta" (mais uma vez, não foi o compositor que colocou o apelido), ele estuda uma alternância entre o pedal e o staccato. É bem curtinho. 10. Em Si Menor - Outro dificílimo, é um estudo de oitavas duplas. Uma figura cromática é tocada em 4 oitavas simultâneas. Peça de exibição. 11. Em Lá Menor - O "Vento do Inverno" é um dos mais impressionantes. Começa como quem não quer nada e então ataca. É muito difícill, trabalhando uma figura descendente na mão direita. Esse estudo foi usado no final do filme "Green Book", numa das melhores dublagens de piano que eu já vi. 12. Em Dó Menor - Um grande final para os dois livros oficiais de Études de Chopin. Esse estudo tumultuado trabalha arpejos em ambas mãos e é uma típica peça de Chopin - "Sturm und Drang", falo sobre isso em outro post. Três Novos Estudos Em 1839, Chopin compôs os 3 Novos Estudos (Trois Nouvelles Études). Bem diferentes em caráter dos Opp. 10 e 25, eles foram concebidos como uma contribuição para a apostila de piano de Ignaz Moscheles. Costumam ser gravados por pianistas que fazem a integral dos estudos. Agora, se não são difíceis (foram feitos para estudantes), são bem bonitinhos. A Edição de Godowsky O pianista e compositor polonês Leopold Godowsky (1870-1938), de quem temos gravações (bem antigas), fez uma série de 53 Estudos a Partir dos Estudos de Chopin. Cada um dos de Chopin rendeu 2 ou mais dos dele. Não dá pra dizer que são composições originais, porque as peças de Chopin estão totalmente reconhecíveis. Mas também não dá pra chamar de arranjos, porque ele fez bastantes alterações. É interessante. No Op. 10 Nº1, por exemplo, ele só inverte os arpejos. Quando um é pra cima, ele faz pra baixo. Se você quiser conhecer, o grande pianista cubano Jorge Bolet gravou alguns. https://open.spotify.com/album/4CPgokGFj4VNxgXZmVQHZA?si=eMclxYKlTLye9E8nVsB9aw Gravações Importantes Andrei Gavrilov - Ninguém toca o Op. 10 Nº 4 tão rápido quanto Andrei Gavrilov. Talvez a Martha Argerich, mas ela não gravou todos os estudos. Os estudos com o Andrei têm falhas (pequenas), mas ganha pontos por não evitar tomar riscos. É de tirar o fôlego. https://open.spotify.com/album/0hRCevyRTex7Q4fgvYvfy6?si=A9va88qVRBqRg4MjLb6UuQ Nelson Freire - Você encontra o Op. 10 num disco com a Sonata Nº 2; e o Op. 25 em outro, com a Sonata Nº 3. Nelson é simplesmente perfeito, sua famosa técnica cai como uma luva nos estudos. Vladimir Ashkenazy - Ashkenazy, no primor de sua técnica, nos dá uma versão peculiar. Ele aceita as dificuldades da peça, mas toca, sobretudo, com tranquilidade. Faz parecer fácil. Guiomar Novaes - Quando gravou os Études, Guiomar já tinha passado do seu auge, mas sua musicalidade certeira, não. Essa é uma gravação para quem quer ouvir mais o aspecto musical do que o técnico. https://open.spotify.com/album/6CjUHqkdYKgxojP6xj0i4w?si=EBi7KkOPSzC7sNcohsBQow
- Rachmaninoff - Concerto Nº 2 - Análise
Vou falar aqui do Concerto para Piano de que mais gosto desde criança. O 2º Concerto para Piano e Orquestra, em Dó Menor de Sergei Rachmaninoff (1873-1943), seu Opus 18, é também o mais popular de todos os concertos para piano já escritos. Desde os anos 50 vem sendo gravado constantemente e aparece facinho nos concertos de qualquer orquestra e pianista. História Foi composto em circunstâncias especiais. Pra entendê-lo, a gente vai ter que voltar um pouquinho. Rachmaninoff tinha começado, em 1891, a carreira de compositor. Sua peça de formatura do conservatório fora o Concerto Nº 1, em Fá Sustenido menor, Op. 1. É uma obra extremamente cativante, bem escrita e segura, especialmente para um compositor de 18 anos. Verdade que a primeira versão, que eu ouvi em gravação de Alexander Ghindin, regida por Vladimir Ashkenazy e com a Orquestra Filarmônica de Helsinki (resolveram gravar a obra como originalmente concebida), é um tanto vazia, como se fosse nua. Mas em 1917 ele faria uma revisão - que é tal como conhecemos a obra hoje - em que a orquestra é mais colorida, intercede mais e de maneira mais certeira. Além de mudar a maneira como algumas frases caminham. Mas, mesmo a primeira versão, mostra um absurdo talento para a melodia, para até mesmo a condução harmônica (e modulações) das frases e uma escrita para piano impetuosa, impecável. Como Moscou era um ovo, bastava uma apresentação para que uma obra chamasse bastante atenção e levasse aquele compositor ao - pelo menos relativo - sucesso. Então. Ele começou bem, e iria despontar de vez com a ópera Aleko, de 1892. Essa lhe garantiu até um editor, que, mais tarde, se provaria de muita utilidade, atirando uns dinheirinhos em épocas mais complicadas. Como todo compositor importante, esperava-se uma sinfonia dele. A morte de Tchaikovsky, que era um mentor para ele, e outros compromissos, adiaram um bocado a sinfonia, mas em 1895 ela saiu. E só foi tocada em 1897. O problema é como foi tocada. A premiére seria regida pelo compositor Alexander Glazunov. Acontece que ele não ensaiou a orquestra o suficiente (a obra tem vários momentos em que precisa de um regente firme e criativo) e ainda deu de beber. Tocou embriagado. Pelo menos é o que recorda Natália Satina, que se tornaria esposa do compositor. Rachmaninoff, na coxia, só ia se contorcendo com cada desafinada, cada entrada errada, cada passagem tocada forte demais ou fraco demais... Ele nem aguentou ouvir o finale (último movimento), indo embora sem olhar pra trás. Como São Petersburgo também era um ovo, espalhou-se do fracasso da peça. Os críticos foram venenosos. A crítica do colega compositor César Cui para o Novosti não ajudou: "Se existe um conservatório no inferno, e a um de seus estudantes talentosos é dada a tarefa de escrever uma sinfonia programática sobre as Sete Pragas do Egito, caso ele escreva uma sinfonia parecida com a do Sr. Rachmaninoff - seu problema não poderia ser resolvido de maneira mais brilhante, e ele encantaria todos seus companheiros de inferno." César Cui A sinfonia em si não era muito carismática - carecia de encantamento melódico e de um bom julgamento sobre a forma - mas tinha muitos méritos. Mas César. Pô. Doeu. Aliás, a palavra que descreve Rachmaninoff nesse momento é devastado: "Depois daquela sinfonia eu não compus mais nada por cerca de três anos. Eu me sentia como um homem que tivesse sofrido um derrame e por um longo tempo perdido seu uso da cabeça e das mãos. Eu não vou mostrar a sinfonia para ninguém, e vou me certificar disso no meu testamento, também." Sergei Rachmaninoff A palavra depressão aparece repetidas vezes em suas biografias. Sua família, preocupada, conseguiu que Sergei visitasse seu ídolo, o grande e já envelhecido escritor Leon Tolstói, mas as duas vezes em que se viram não foram de muito agrado para o compositor. Tolstói ficava repetindo coisas como "você acha que eu estou sempre satisfeito comigo", "você acha que tudo na vida é fácil?", ou "Trabalhe, trabalhe todo dia"... "Frases de efeito", segundo Rachmaninoff. Outra coisa que os parentes tentaram foi levá-lo a um terapeuta, que seria hoje o equivalente a uma mistura de psicanalista com hipnoterapeuta. Ele estava tão desesperado que aceitou ver toda semana o Dr. Nikolai Dahl. Foi o ponto de virada de sua vida. Ele ganhou intimidade com o doutor, que era apaixonado por música, e foi recuperando sua auto confiança. Surgiu uma oportunidade de concerto pra ele fazer em Londres, e ele queria escrever uma obra para isso. Então eles ficavam repetindo literalmente (trabalho de sugestão) "eu vou voltar a compor", "eu vou escrever um concerto de que todos vão gostar". Tá bom de eu dizer umas coisas dessas em voz alta, porque funcionou muito bem. Em 1900 ele compôs os dois últimos movimentos e os estreou. Depois compôs o 1º movimento e estreou tudo de novo, em 1901, em Moscou - o concerto na Inglaterra esperaria. Ele dedicou a obra ao Dr. Nikolai Dahl. A partir daí a carreira dele decolou, sendo solicitado para tocar no EUA com frequência, partindo pela primeira vez em 1909 - sobre isso falo nesse artigo. Ele casou em 1902 com a Natália, e foi um casamento feliz e próspero. Agora vamos conhecer um pouco da obra. O Concerto Acima, você vê o célebre pianista russo Evgeny Kissin executando o concerto com a Orquestra Filarmônica da Rádio Francesa, regida por Myung-Whun Chung. 1º Movimento - (um tal de) Moderato A obra começa (50s) com os famosos acordes à guisa de sinos no piano. Ele faz um crescendo até que desemboca no primeiro tema, tocado pelas cordas com um clarinete (1m19s até 2m46s). Este recurso de apoiar as cordas com apenas um instrumento de sopro é bem comum em Rachmaninoff, e certamente comum nesse concerto. Sobre esse tema, ele é tão comprido que o compositor sempre teve medo que as pessoas achassem que era uma introdução, em vez do tema principal. Mas ele recebe muito tratamento temático, repare quantas vezes você vai ouvir esse motivo ondulado, da frase que abre o tema, por todo o movimento. Depois de uma ponte do piano (3 min.), bem ligeira, que cai num acorde em fff da orquestra, o próprio piano dá o segundo tema (3m25s). Uma melodia super lírica e muito bonita. Preste bem atenção nos dois elementos que compõem esse tema: um arpejo ascendente e um rabinho serpenteado. Mais ou menos assim: Os dois motivos centrais do segundo tema são os circulados ao lado desenhado por um profissional. Preste bem atenção no segundo. Ele irá se tornar um "vírus", que é um elemento que vai tomando conta da música até dominá-la por completo. O segundo tema é repetido e desenvolvido imediatamente. Um breve e lindo diálogo do piano com o clarinete e o oboé, é seguido por uma doce subida e descida, baseada no primeiro motivo do desenho profissional. Um toque dos metais (5m53s) anuncia o desenvolvimento. O primeiro tema volta (6m06s), desta vez com caráter urgente. E aí o vírus começa a agir. Primeiro você o ouve na flauta (6m12s). Ele aparece de duas formas: puro, como o do desenho; ou precedido de três notinhas. O piano é logo contagiado por ele. O desenvolvimento todo é sobre os dois temas principais, mais o vírus. No ponto culminante (7m50s), ele faz uma mistura de final de desenvolvimento com começo da recapitulação. A orquestra toca o tema 1 enquanto o piano vai tocando o vírus. A segunda metade do tema 1 cabe ao piano. Quando entra o segundo tema (9m42s), é na trompa, de forma mais calma - como tinha que ser, ao suceder a recapitulação turbulenta do tema 1. O vírus ameaça ainda (10m18s), e fica. Agora ele dominou o movimento. Tudo o que se segue é uma elaboração dele. Ele aparece bem espaçado no piano nesse trecho (10m33s) em que os violoncelos fazem o arpejo do tema 2, num momento cheio de modulações, até que chega o coda (12m03s). E bem no finalzinho o piano faz uma referência ao 1º tema (12m36s). 2º Movimento - Adagio sostenuto O segundo movimento tem um formato mais livre, com um tema principal, uma parte B (com uma semi cadência) e a volta do tema. É o movimento lento da obra. Vamos lá. Tudo começa nas cordas (13m08s), que fazem uma das modulações (mudança de tonalidade) mais famosas do repertório - passa de Dó menor a Mi maior. Aos 13m34s o piano começa uma série de arpejos que vão servir de acompanhamento para o tema principal do movimento, que começa na flauta (13m58s) e é belamente entregue ao clarinete (14m20s). Esse tema é uma longa e linda cantilena, terminando com a flauta se juntando ao grupo (15m21s). Agora (15m33s) o piano repete, de maneira bem simples, o tema, enquanto o clarinete devolve a gentileza e o acompanha com o mesmo arpejo. A primeira parte termina com um acorde de Si Maior subitamente mudando para Si Menor (17m30s), dando início à seção mais atormentada desse movimento (17m39s), que funciona um pouco como desenvolvimento. A música vai ganhando tensão até explodir numa cadência curta e virtuosística do piano. Não se trata de uma cadência no sentido clássico-romântico, mas de um momento em que o piano fica mais exposto (21m15s). As flautas (22m10s) anunciam a volta à paz. O piano começa seus arpejos e as cordas entram com o tema (22m44s). Depois de uma culminância (24m08s) a orquestra vai perdendo a força até deixar só o piano, que termina o movimento. 3º Movimento - Allegro scherzando O terceiro movimento é bem rápido (25m53s). A orquestra começa como que brincando (scherzando) e cresce bem rápido até que entra o piano com uma escala bem rápida. É o movimento mais difícil e virtuosístico da obra. Seu tema principal aparece sensual, primeiro nas cordas e no oboé (27m47s), e é imediatamente repetido pelo piano (28m25s). Depois temos um momento exótico (29m27s), sucedido por mais um momento de virtuosismo (30m05s). A história é repetida: tema principal do movimento nas cordas, dessa vez com a flauta (32m23s), repetido novamente pelo piano (33m). Novamente sucedidos pelo momento exótico (34m09s). Mais um momento virtuosístico leva a uma explosão da orquestra (36m06s), que faz o piano repetir a escala do começo (36m10s) e parar dramaticamente. Então (36m26s) explode o tema principal, dessa vez glorioso e brilhante. Não poderia haver finale melhor (e que puxasse mais aplausos) não só para o concerto, como para toda a história que o cerca. Suntuoso e triunfal. Gravações Importantes Como eu falei, quase todo pianista tem que gravar o Concerto Nº 2 em algum ou em vários momentos da sua carreira. Aliás, hoje em dia não vemos muito isso, de um intérprete gravar a mesma obra várias vezes. Mas antigamente, até os anos 70 ou até mesmo 80, isso era comum. O grande mestre russo Vladimir Ashkenazy gravou esse concerto pelo menos 3 vezes como pianista e uma como regente. Foi ele quem regeu a gravação que eu mencionei acima dos originais do Concerto Nº 1 e do Nº 4. Mas vamos ao que interessa. - Sergei Rachmaninoff, com a Orquestra de Filadélfia, regida por Leopold Stokowski - O simples fato de termos um grande compositor do romantismo que gravou suas obras já é demais! O som é cheio de chiado (a gravação é de 1929, e é até boa pra época), mas vale à pena. É uma interpretação completamente sem frescura, sem exageros, rubatos e crescendos desnecessários. Stokowski era o regente do momento e a Filadélfia, a orquestra perfeita. Além disso, tinha-se implantado recentemente a gravação elétrica, uma nova forma, bem mais fiel, de captar o som. A dupla já tinha gravado a mesma obra em 1924, mas a qualidade do som é pior. Nessa gravação de 29, o compositor/pianista e o regente tinham discordâncias, com Rachmaninoff mais comedido e Stokowski mais dado à grandiloquência. Sergei gravaria os outros 3 concertos com a mesma orquestra regida por Eugene Ormandy (não porque brigara com Stokowski, apenas este não era mais o titular da orquestra). Esta gravação explica por que os pianistas tocam os acordes iniciais mais lento do que o andamento do primeiro movimento. Rachmaninoff o fazia. - Krystian Zimerman, com a Sinfônica de Boston, sob a batuta de Seiji Ozawa - Tanto Zimerman quanto Ozawa são intérpretes fenomenais, ainda que um tanto exagerados. Mas nessa gravação estão impecáveis. Vem num CD junto com o 1º Concerto, na interpretação definitiva deste. É extraordinário. Tudo, inclusive a sincronia assustadora que eles alcançaram. - Sviatoslav Richter, com a Filarmônica de Varsóvia, sob Stanislav Wislocki - Se você perguntar a qualquer conhecedor desse concerto por uma interpretação boa e saudável dessa obra, vão te dizer pra começar com essa. O som não é perfeito, mas é muito bom. A orquestra não era também essas coisas. Mas a interpretação como um todo acaba sendo justamente isso: a mais indicada. - Alexis Weissenberg, com a Filarmônica de Berlim e Herbert von Karajan - Tem uma gravação em vídeo (fuja dessa, já começa com Weissenberg propondo um andamento e Karajan deliberadamente acelerando) e a gravação de estúdio. Esta, de 1972 beira a perfeição. Weissenberg tinha uma técnica de máquina - ele não era expressivo em excesso, mas mecanicamente, nunca vi igual - e se adequava muito bem a Rachmaninoff. Karajan, que nunca gravou outra coisa desse compositor, se mostra inspirado do começo ao fim, e a Filarmônica, impecável. A flauta e o clarinete do 2º movimento são tocados com tanto carinho que dá dó. - Vladimir Ashkenazy, com a Orquestra do Concertgebouw, de Amsterdã, regida por Bernard Haitink - Gravação com um som magnífico, acho mais interessante que a do mesmo pianista regida por Previn. Mas só levemente, ambas são muito fortes. O próprio piano (que eles escolheram) tem um som impactante. As cordas da Concertgebouw, na entrada, soam já fantásticas. Tudo é mágico, e se você quiser se perder na música, ouça esta gravação. O único problema é que a prática da época (anos 70) era de interpretar as obras com certas nuances que hoje pareceriam dramáticas. Mas, sabendo que é coisa de época, dá pra perdoar. Leia sobre o 1º e um pouco mais sobre o 2º Concertos aqui. Aqui sobre o 3º e aqui sobre o 4º. Gostou do post? Não esqueça de comentar e de clicar no coraçãozinho, pra gente saber que você gostou do conteúdo.
- microliteratura de marcio markendof #01: microcontos críticos
Brevíssimas histórias sobre questões de gênero. A microliteratura tem ganhado cada vez mais espaço na vida literária brasileira, muito especialmente em razão das redes sociais (Twitter, Facebook, Instagram), canais que facilitam a circulação desses produtos. Com uma nomenclatura variável — nanocontos, microcontos, miniconto —, a microliteratura da internet apresenta textos de umas poucas linhas/caracteres, às vezes acompanhados por imagens ou legendas, componentes paratextuais que complementam, reforçam ou ironizam o conteúdo do (micro)texto principal. Tal formato mínimo de escrita pode manter paralelos, por exemplo, com a linguagem do chiste, da charge, do aforismo ou do meme, frequentemente sendo permeado pelo humor e pela crítica social. Na pequena seleta abaixo, a intenção é problematizar questões de gênero e sugerir a reflexão sobre a heterossexualidade compulsória. Marcio Markendorf Professor, pesquisador e escritor. Leciona no curso de Cinema e na Pós-graduação em Literatura da UFSC. Publicou a novela "Soy loca, Lorca, feito um chien no chão" (Urutau, 2019) e, em parceria com Adriano Salvi, o volume de microliteratura, "Microcontando" (Caiaponte Edições, 2019), obra financiada pela lei de incentivo à cultura de Balneário Camboriú. Mantém uma conta dedicada às formas breves no Instagram ( @microliteratura ).
- Pitch meeting Legendado 3 - Eclipse
Parte 3. Veja a segunda aqui e a primeira aqui. São legendas das reuniões de roteiro do canal do YouTube Screen Rant. Não esqueça de comentar aí em baixo. Não deixe de conferir nossas listas de: Top 10 Sinfonias Top 10 Concertos para Piano Top 10 Sonatas para Piano
- Rachmaninoff - Concerto para Piano Nº 3
Em 1909 o compositor russo Sergei Rachmaninoff partia para uma turnê nos Estados Unidos. Ele queria surpreender o público e ainda prestigiá-lo com uma nova obra. Foi por isso que escreveu o 3º Concerto para Piano, em Ré menor. Sendo 2º Concerto extremamente famoso, o compositor partiu em outra direção. O terceiro é uma obra mais fechada, mais obscura e consideravelmente mais difícil, tanto para o piano quanto para a orquestra. Diz-se que na viagem até o continente americano, o compositor praticava no navio em um teclado de piano de madeira, mudo, que mandara fazer. A segunda performance da obra, em Nova Iorque, é mais famosa que a primeira. Isso porque o regente era ninguém menos que Gustav Mahler. Por essa apresentação, ocorrida já em 1910, Rachmaninoff sempre teve enorme carinho. Mahler ensaiou exaustivamente a orquestra até que tudo ficasse perfeito. É a obra que aparece no filme Shine, no qual dão a entender que foi ela a responsável pelo colapso nervoso do pianista David Helfgott. É constantemente considerado o concerto para piano mais difícil do repertório tradicional. Foi dedicada ao polonês Josef Hofmann, que Rachmaninoff dizia ser o maior pianista da época (Hofmann dava o mesmo elogio a Rachmaninoff). Mas este nunca o tocou: tinha mãos pequenas, que não são favorecidas pelo concerto. Ele dizia apenas "não é pra mim". Amigo, é exatamente pra você! Por falar em mãos, as de Rachmaninoff eram gigantescas. As minhas pareceriam as de um Hobbit em cima das dele. Ele alcançava uma 13ª. De dó ao outro lá. O compositor gravou a obra, com alguns cortes, para que coubesse no disco. Abaixo, deixo a gravação de outro prodígio russo, o jovem Daniil Trifonov, com o regente coreano Myung-Whun Chung e a Orquestra Filarmônica da Rádio França. A Cadência Cadência é um momento de um concerto em que a orquestra para, de fato, e o solista toca sozinho a parte mais difícil possível, pra mostrar seu virtuosismo. Ela pode ou não ser escrita pelo compositor. É que às vezes eles deixam apenas uma indicação na partitura de que ali deve se iniciar a cadência. Alguns concertos têm cadências nos três movimentos, outros apenas em um. Alguns não têm, como o 2º Concerto de Rachmaninoff, o de Chopin etc. Há, ainda, concertos que têm várias opções de cadência, como é o caso de alguns dos de Mozart, para os quais vários compositores, Beethoven incluso, deixaram as suas contribuições. A cadência é o momento pelo qual todos esperam num concerto. Como será que o solista vai se sair? Ainda assim, ela está presa à obra (o concerto), e dificilmente uma delas toma vida própria e se aloja no nosso imaginário tão fortemente quanto o próprio concerto a que pertence. Mas há casos. A que talvez seja a mais conhecida cadência de concerto é a do primeiro movimento do 3º Concerto para Piano de Sergei Rachmaninoff. Ou as. O compositor escreveu uma tão titânica e eloquente que alguns consideraram titânica e eloquente demais, com seus dois pontos culminantes. Daí ele fez uma nova, mais leve, ligeira e com apenas um grande pico. Lembra uma tocata. A primeira passou a ser chamada de cadência ossia. O próprio compositor gravou a segunda (a pequena, a tocata, é assim que a gente chama). Grande parte das maiores gravações do concerto é com essa cadência. Martha Argerich, Vladimir Horowitz, Yuja Wang... Eu prefiro a ossia, menos sutil, mais apaixonada (e consideravelmente mais difícil). Mas sei que é difícil achar o tom certo nela. Você tem que crescer na parte que leva ao tema, e então, introduzi-lo de maneira inquestionável, sem hesitar (ou hesitando calculadamente, como fez Van Cliburn). Mas aí é que está, você não pode estourar tudo nessa hora, porque depois vêm os acordes explosivos, você tem que guardar pólvora pra eles. Algumas vezes ela pode ser sufocante, como no caso de Lazar Berman, que não deixa você respirar. Eu gosto, mas não é pra todo mundo. Na maior parte das vezes (até com Daniil Trifonov) ela promete tanto, que acaba não podendo cumprir. E é por isso que muitos escolhem a tocata. Gravações Importantes I. Com a Cadência (tocata) - Martha Argerich (com a Deutsches Symphonie-Orchester de Berlim, sob Riccardo Chailly) - considerada a versão moderna definitiva do concerto (assim, de 1982), a mais ágil, potente e expressiva. Martha Argerich. É uma gravação ao vivo, e dizem que Chailly lutava pra manter a orquestra no andamento dela. Não acho isso, não. Tudo é muito bem ensaiado, e, se há tensão, é proposital. Aliás, você ensaiar que está perdendo o controle é que é impressionante! - Vladimir Horowitz (com a Orquestra Filarmônica de Nova Iorque, sob John Barbirolli) - Horowitz gravou este concerto várias vezes, mas esta, de 1941 com Barbirolli é a mais impressionante, muito embora o som seja ruim. Vale lembrar que o próprio Rachmaninoff, modesto, dizia que Horowitz tocava o concerto melhor que si. Horowitz não dá ideia de que o concerto seja difícil, tocando com grande fluidez e facilidade. - Sergei Rachmaninoff (com a Orquestra de Filadélfia, sob Eugene Ormandy) - ouvir o próprio compositor tocando, ainda que com algumas edições (tiveram que cortar partes da música para caber nos discos) é fantástico. Valeu, Sergei. É uma versão leve como a de Horowitz, de quando a peça ainda não era conhecida como a mais difícil do repertório. Aí eles tocavam relaxados. - Earl Wild (Royal Philharmonic Orchestra, sob a regência de Jascha Horenstein) - mais uma interpretação eletrizante. O pianista americano, um dos grandes do século XX, dá uma aula. - Alexis Weissenberg (Sinfônica de Chicago, Georges Prêtre) - Weissenberg é um dos meus pianistas favoritos. Sua interpretação é viril e sem frescura (como sempre). A agilidade e, principalmente a técnica de cinco dedos e de oitavas do Weissenberg são impressionantes. - Vladimir Ashkenazy (Sinfônica de Londres, sob a regência de Anatole Fistoulari) - a primeira e fluida gravação de Ashkenazy, uma lenda do piano, que ainda gravaria a obra outras vezes, só que tocando a outra cadência. - Alicia de Larrocha (com a Sinfônica de Londres, sob André Previn) - uma gravação de quem não tem que provar nada. Alicia toca com a doçura de quem toca Mozart. Mas sua técnica vem inquestionável quando requisitada. De 1975, a gravação, digo o som, é excepcional. E o bom gosto da pianista é notável. - Lilya Zilberstein (com a Filarmônica de Berlim, sob Claudio Abbado) - uma das gravações com melhor som, de 1994, e, possivelmente a melhor orquestra. Lilya é discreta, mas toca muito bonito. Recomendo demais essa gravação. - Jorge Bolet (com a Sinfônica de Londres, regente Iván Fischer) - Jorge Bolet, um cavalheiro cubano que fez sucesso um pouco tardiamente, tinha uma técnica que colocava a maior parte dos outros pianistas no chinelo. Aqui ele a mostra toda, em uma interpretação que só carece de uma coisa: maior séquito. - Arnaldo Cohen (com a Sinfônica Estadual de São Paulo, com a regência de John Neschling) - talvez a versão brasileira mais conhecida. Arnaldo é um pianista sensacional, sobre quem eu já falei nesse post. O tratamento dado por eles ao concerto é encantador. Mais do que convincente, é autoritário. Pena que não se pode encontrar no Spotify. Eu tenho em CD, mesmo. É de 2008. - Nelson Freire (com a Filarmônica de Roterdã e David Zinman) - outra versão brasileira. É uma gravação ao vivo do final dos anos 70. Nelson estava endiabrado. Se a gravação tivesse saído na época, seria tão adorada quanto a da sua BFF Martha Argerich. Hoje a gente encontra num álbum duplo chamado Nelson Freire - Radio Days. - Yuja Wang (com a Orquestra Sinfônica Simón Bolivar, sob a batuta de Gustavo Dudamel) - a maior pianista da sua geração (tem hoje 30 e poucos anos), Yuja é famosa pelos vestidos ousados e cortes de cabelo jovens. Mas consegue ser mais famosa pelo seu piano, que acho que é o ponto que ela quer provar. Que o modo de se vestir não é uma declaração de intenções, mas um gosto pessoal que não deve e não pode interferir na sua avaliação profissional. No disco, junto com o Concerto Nº 2 de Prokofiev, tão difícil quanto esse, ela tira de letra. Essa menina toca com uma facilidade que lembra uma mistura de Argerich com Horowitz. II. Com a Ossia Cadência A cadência mais difícil é também ligeiramente menos gravada. No começo ninguém gravava, acho que foi Van Cliburn que estabeleceu a tradição. - Vladimir Ashkenazy (com a Sinfônica de Londres regida por André Previn) - outra referência moderna na história das gravações desse concerto. Muito conhecida porque é excelente e porque sempre esteve facilmente disponível em LP, CD e hoje, mais ainda, nas plataformas digitais. - Vladimir Ashkenazy (com a Orquestra do Concertgebouw de Amsterdã, sob Bernard Haitink) - Ashkenazy gravou tanto esses concertos (os 4 de Rachmaninoff), que acho que se cansou e resolveu gravar depois como regente. Falo depois sobre essas empreitadas. Entre o ciclo com Previn e o ciclo com Haitink, cada qual tem seus encantos. Nesse concerto em particular eu não sei qual das duas recomendaria, daí botei as duas aqui. - Lasar Berman (Sinfônica de Londres, sob Claudio Abbado) - essa gravação é fenomenal. Berman toca com um peso, como se estivesse vencendo uma montanha. Ao mesmo tempo em que parece estar tendo dificuldade, não falha nunca. A cadência é o momento mais impressionante, e ele opta por não deixar o ouvinte respirar, crescendo, e crescendo, e crescendo... Se o regente não fosse Claudio Abbado, teria dificuldade em acompanhar o raciocínio dele, especialmente no 3º movimento. - Van Cliburn (Symphony of the Air, Kiril Kondrashin) - Van Cliburn foi o primeiro pianista americano a vencer o Concurso Tchaikovsky, na Rússia, aos 23 (em 1958, na Guerra Fria). Tocou este concerto e o 1º de Tchaikovsky na final, recebendo 8 minutos de aplausos e gritos de "deem-lhe o prêmio". Essa gravação é de quando voltou aos Estados Unidos, tocando no Carnegie Hall. Tem uma energia, uma tensão imensas, porque parece que o público vai explodir de excitação. - Cristina Ortiz (com a Orquestra Philharmonia, sob a direção de Iván Fischer) - Cristina é outra que eu incluí na lista dos maiores pianistas brasileiros. O que ela faz com esse concerto é desconcertante. Um desconcerto. Ela tem uma força e uma destreza que causam inveja. Tocando a cadência, parece que as cordas do piano vão quebrar. Eu gosto muito dessa gravação, que nunca é incluída nas listas de favoritos dos outros. - André Watts (com a Filarmônica de Nova Iorque, sob Seiji Ozawa) - essa gravação é um prodígio. André quebrou barreiras ao se tornar o pianista negro mais famoso do mundo. Sua técnica é milagrosa. Aqui ele decide tocar uma cadência híbrida: começa com a pequena e logo se torna a ossia. Uma curiosidade é que essa é uma das pouquíssimas gravações em que um pianista toca o ossia finale - os acordes, bem no final do terceiro movimento, tocados por todos em grupos de três, ele toca em grupos de quatro. É insano. - Daniil Trifonov (com a Filarmônica de Berlim, sob a regência de Simon Rattle) - acho que a única maneira de você ouvir essa versão é assinando o Digital Concert Hall, a plataforma de streaming de concertos da Filarmônica de Berlim. Trifonov é um dos pianistas mais talentosos e bem acabados dos nossos tempos. Essa versão supera a que ele lançou em disco, com Yannick Nézet-Séguin (que também é excelente) pela proposta. Eles fizeram esse monumental concerto em tons pastel. Existe uma ligação entre Rattle e o pianista, eles estão sintonizados. E tocam a obra sem grandes arrebatamentos, mas com uma sensibilidade incrível.
- O nó de Rubem Fonseca
Rubem Fonseca morreu. Ele morreu e a Regina Duarte nem se deu conta disso na breve passagem pela secretaria (que era um Ministério da Cultura e que, aliás, eu comento e critico aqui). Mas quem foi Rubem Fonseca mesmo? Dizer que Rubem foi um escritor ou, ainda, o maior expoente da literatura policial brasileira, um neonoir tupiniquim, um dos grandes escritores do século XX de nosso país... Bom, tudo isso já foi dito e é até meio clichê (não que eu odeie clichês) e, talvez, justamente por esta razão não tenha vontade de falar desse aspecto que, potencialmente, quase todo mundo já sabe: é o básico. A desculpa de usar o Rubem Fonseca no título (e, de quebra, nessa linda foto de cabeçalho) foi o seu potencial alegórico e metafórico, além, claro, de poder homenagear um dos meus escritores preferidos desde a época em que eu tentei ser jovem. Rubem foi policial (neste artigo da revista Fórum podemos ver mais detalhes sobre sua formação), porque acho que, com exceção de Paulo Coelho, ninguém consegue ser escritor em tempo integral no Brasil. Nas horas vagas ele escrevia. E, como um artista só consegue criar a partir do que conhece, ele escrevia histórias policiais cheias de violência, vingança e escatologia. Como boa parte dos policiais que trabalharam nos anos 60 (quero deixar claro: não todos, mas boa parte, mas não todos, mas boa parte...) Fonseca foi um convicto anticomunista e ser anticomunista na ditadura militar era quase sempre sinônimo de delator, espião e torturador. Pelos documentos levantados, Fonseca fez parte da minoria anticomunista que não torturou nem delatou ninguém. Marcelo Rubens Paiva - outro grande escritor por quem nutro admiração - escreveu um ótimo artigo para o Estadão sobre isso. Marcelo é filho do emblemático engenheiro e deputado federal Rubens Beydrot Paiva assassinado na ditadura militar por Antônio Fernando Hughes de Carvalho e, por incrível que pareça (e esse é o cerne da questão que tento trazer aqui) admirador da estética fonsequiana. Ou seja, Marcelo Rubens Paiva tinha tudo para queimar todos os livros de Rubem Fonseca, mas é maduro o suficiente para perceber a complexidade das coisas. Estamos num período mais uma vez conturbado, onde muitas pessoas, sobretudo jovens, jogam certezas uns nos outros como se fossem pedras envoltas em arames farpados. E aí existem pessoas que param de ouvir os discos de um determinado artista porque descobriram que, em 1978, aquele artista bateu no carro de um vizinho de uma prima de não sei quem e fugiu sem pagar pelo prejuízo. Os artistas precisariam serem puros para serem admirados. Analisemos, pois, quem admirava Rubem Fonseca. Fonseca era extremamente bem quisto pelos militares por seus serviços prestados pela fundação do instituto Ipês, cuja formação ideológica serviu de base política e cultural para o golpe (do qual Rubem, posterior e publicamente, repudia) como podemos verificar também neste excelente artigo do site Zona Curva. Quando escrevo formação ideológica básica para o golpe, leia-se: a função do Instituto Ipês era desestabilizar o governo João Goulart. Todos sabem o que aconteceu depois, mas aqui só para podermos dar claramente nome "aos bois": ditadura militar. Longe de mim dizer que João Goulart era comunista (nunca acreditei nessa narrativa) de fato, ou que seu (extremamente breve) governo foi maravilhoso ou horrível (nem tenho fundamento para isso). Mas apoiar uma ditatura que, como tal, derramou muito sangue inocente, aí já é demais. Voltando ao assunto... Rubem Fonseca era respeitado pelos militares enquanto pessoa, apesar de sua obra sempre polêmica, chocante e perturbadora, essa dualidade, portanto causava desconforto entre os mesmos militares que o respeitavam. Um conto que acho arrebatadoramente violento de Rubem, O Cobrador, pode ser perfeitamente interpretado como uma obra de denúncia sobre a exclusão social que fabrica boa parte dos bandidos que conhecemos. Já os contos Passeio Noturno 1 e 2 mostram outra face da violência: a da classe abastada que literalmente atropela os marginalizados que ela mesma produz. Nascemos para a violência como profetizaram Arthur C. Clarke e Stanley Kubrick no prelúdio de 2001, uma Odisséia no Espaço. A despeito disso, Rubem Fonseca parecia ter uma espécie de dupla personalidade. Lembro que, anos atrás, na minha primeira especialização, foi citado o caso de um TCC em que a autora (creio que era uma autora) defendia algo no texto e, nas notas de rodapé, defendia o contrário. Eu achei isso fascinante (a despeito de uma possível bipolaridade, esquizofrenia ou falta de atenção). Ocorre que é mais ou menos isso que podemos presumir de Rubem Fonseca. Rubem era o escritor transgressor, ousado, violento, agressivo e subversivo que afrontava a moral e os bons costumes. Já Fonseca era igualmente um autor e um ideólogo a serviço de algo que se revelou um grande golpe militar. Desse modo, estamos diante de um verdadeiro nó ideológico. Se abrirmos mão de boa parte de nossas certezas e percebemos como a realidade é, de fato, complexa, a coisa fica bem mais fácil. Sim, porque complexo não é necessariamente algo difícil e o simples, muitas vezes, não é fácil. Mas nesse mundo que cada vez mais segmenta, Rubem Fonseca vira essa criatura que boa parte da "intelligentsia" jovem e militante não suportaria engolir sem estar disposta a sofrer de indigestão ideológica. Porque a arte dele potencialmente diz uma coisa, enquanto seu comportamento civil diz o oposto. Interessante, não? Ainda mais quando a própria obra dá margem para múltiplas interpretações. E digo isso porque, sob algum aspecto, quão melhor é uma obra de arte, mais "níveis de leitura" ela tem. Além disso, a arte é esse mistério eterno por nunca dizer nada diretamente. Mas é claro, que do mesmo modo que um artista cria a partir do que conhece (como falei acima), nós interpretamos as coisas a partir do que conehcemos também, e do que acreditamos, mas já, já chego nessa parte. O fato é que no momento em que ela, a obra de arte, diz algo diretamente, você acaba com todas as demais possibilidades interpretativas dela. Entretanto, melhor do que explicar é exemplificar: Publicamos aqui um Top 10 de Sinfonias "imprescindíveis" para quem quer se aventurar no mundo da música clássica. Sugiro ler, especificamente, sobre a Sinfonia número 5 de Dmitri Shostakovich. E aí, trazendo essa questão para o Rubem Fonseca, pergunto: Será que O Cobrador fonsequiano está falando de tudo que a sociedade capitalista tira dos pobres ou está apenas validando politicamente a violência? Como disse, a vida é complexa e militar em nome de causas, parece, cansa. E quando digo militar não falo da militância política raivosa, festiva e mística da internet (inclusive ddos militantes que "militam errado"), mas falo da militância estética, o artista que está sempre destruindo, provocando e reconstruindo as estéticas. Isso gasta tanta energia que a vida pessoal do ser humano vira um marasmo conservador (no pior sentido do termo), quando não raivoso. Solto essa questão aqui porque, falando dessa dicotomia artista-obra (que, muitas vezes, se complementam e em outras se contradizem), não faltam exemplos que encontramos com facilidade, formando uma lista interessante (nada pequena) de artistas que foram esteticamente transgressores e politicamente conservadores. Um exemplo que ainda me assusta um pouco é o de Glauber Rocha, que elogiou publicamente um dos grandes líderes e mentores do golpe militar de 1964: Golbery do Couto e Silva, além de Ernesto Geisel. E eu não vejo nenhum jovem membro da intelligentsia militante que busca a todo custo o unicórnio stalinista sagrado da pureza revolucionária consagrada e lacradora boicotando Glauber e o motivo óbvio é que se boicotarmos Gláuber, abre-se um enorme vácuo no cinema brasileiro, que ficaria sem seu principal referencial marginal, tropicalista, político e vanguardista. Sem Gláuber sobraria no cinema apenas Mário Peixoto passível de reverência como artista disruptivo, mas o cara só fez um filme, aí fica foda. Exemplos fora do Brasil também não faltam e um particularmente instigante é o do beatnik canadense Jack Keruac que, como todo bom beatnik, foi um dos pilares fundadores da contracultura norteamericana (tornando-se depois o que comumente muitos chamam de "cultura jovem") e que, segundo relatos biográficos diversos, era uma pessoa quieta, chata, católica e conservadora. Existe inclusive um site chamado The American Conservative (não vou deixar linque porque não sou realmente obrigado), que faz uma análise no mínimo interessante sobre como seu conservadorismo e a busca por seu Deus Católico guiaram sua literatura, apenas confirmando que boas obras, em geral, têm múltiplas interpretações. Existe, ainda, o polêmico e controverso caso da escritora, roteirista e atriz Thea von Harbou que, apesar do trabalho incrível como o romance Metrópolis (originando o filme homônimo roteirizado por ela e o diretor, seu esposo à época, Fritz Lang) teve um mal explicado envolvimento com o nazismo. Segundo Thea, ela se filiou ao partido para proteger seu esposo indiano, mas o caso é realmente tão complexo que a edição brasileira de seu mais famoso romance traz uma espécie de isenção/justificativa/explicação da editora sobre seu envolvimento com o partido hitlerista de modo a evitar romantizações sobre o caso. Outros dois exemplos na música pop internacional são Morrissey principal compositor e idealizador do Smiths e John Lydon/Johnny Rotten. Lydon (também conhecido como Johnny Rotten) além de fã declarado do transgressor social (esteticamente bem mais conservador) Oscar Wilde, Rotten foi simplesmente vocalista do Sex Pistols. Não faz muito tempo, ele foi flagrado com uma camiseta de apoio a Donald Trump. Especificamente sobre Lydon, que fez fortuna negociando propriedades a partir do seu capital inicial advindo do cachê de sua carreira musical (algo no mínimo contraditório para alguém que se vendia como punk), eu não tenho como dizer nada muito além de que eu sempre considerei o movimento punk uma grande farsa (sim, uma grande mentira capitalista) a despeito de um punhado de músicas que julgo divertidas e de sua inegável importância na cultura new wave dos anos 80, além de uma potente influência na literatura, nos quadrinhos e cinema marginais dos anos 70 (eu posso escrever um texto detalhado depois, ao menos para não me acusarem de polemista gratuitamente). O fato é que pouquíssimos artistas, a meu ver, podem ser verdadeiramente classificados como "anarco-punks", então Lydon é apenas mais uma prova do que penso: ele nunca foi punk. Ou apenas um "rebelde sem causa" (como a canção do Ultraje a Rigor) que apenas queria chocar os pais quando jovem. Já Morrissey anda colecionando declarações racistas e xenófobas (sobretudo com relação a asiáticos) enquanto posa de bom moço da causa vegana (alguém lembra do Dado Dolabella? Ele alegou recentemente ter descoberto - após virar vegano - que na época em que bateu na esposa a causa disso foi seu excessivo consumo de carne que o tornava violento, pois a carne é um alimento advindo da violência e deixa essa marca "energética" na comida). E quero salientar (porque hoje em dia precisamos salientar tudo) que não tenho nada contra veganos (e vou até dizer a famosa frase "até tenho amigos que são"), mas uma coisa não tem nada a ver com a outra, mesmo que você queira que tenha. Além disso, soube da campanha do Eric Clapton contra o isolamento social necessário ao enfrentamento da pandemia do coronavírus, mas que veio junto ao resgate de falas racistas e xenófobas dele. Ou seja: exemplos sobram. Bem mais do que eu gostaria. O último é brasileiro: Elba Ramalho que fez parte de um grupo que renovou a MPB no anos 70 entrou numa de fazer discursos lisérgios sobre os cristãos serem a última muralha de proteção da sociedade contra o comunismo. Agora voltemos a Rubem Fonseca... Sabe aquela frase de que quando Pedro fala de Paulo eu sei mais de Pedro que de Paulo? É mais ou menos assim que as coisas na chamada "teoria do leitor" se processam. Antes, as pessoas se calcavam no que genericamente chamamos "teoria do autor" e tentavam esmiuçar todas as possibilidades de significados que um autor ou uma autora tinha colocado em suas criações. Goethe tripudiou isso de forma incrível em seu texto O Conto da Serpente Verde e da linda Lily (conhecido apenas por "O Conto" - em alemão, Das Märchen): disse que quando 52 interpretações tivessem falhado, ele diria o "real" significado dessa obra, espécie de precursora do surrealismo. Bom, ele morreu antes. Mas a dica foi 52, o número de cartas de um baralho, e o conto era visivelmente inspirado no tarô. Perceba: quando alguém lê os contos de Rubem Fonseca (e de qualquer outra pessoa) ela está colocando ali sua visão de mundo. Quando o personagem Cobrador de Rubem Fonseca ameaça o dentista logo no início do conto, você fica do lado de quem? Aliás, consegue escolher um lado? Acha necessário escolher um lado? Em seu conto Curriculum Vitae, publicado no livro de estreia Os Prisioneiros, em 1963 (e um dos meus contos preferidos dele e de tudo que li já na vida), Rubem fala que "todo homem é uma ilha, vamos deixar de poesia". Seria isso? Cada pessoa em seu universo particular interpreta como lhe convém, de acordo com suas crenças e sabe "dosar" essas crenças, afinal, cada texto tem um contexto. Em outras palavras, uma coisa é uma tatuagem de um símbolo viking no braço da Björk, outra uma tatuagem viking no braço daquele seu primo que enche a boca para pronunciar erroneamente o sobrenome alemão do tio-avô dele de Blumenau e que tem um suspeito interesse em temas da II Guerra Mundial. Bom, em algum momento eu vou precisar concluir esse texto, e algo me diz que é agora... O fato é que nosso cérebro tem dois hemisférios e isso pode ser uma grande metáfora para como entendemos o mundo, já que um tende mais ao que chamamos de "emoção", enquanto o outro tende ao que chamamos de "razão". A política e a arte transitam com facilidade entre essas duas searas de nossa vida pessoal e social. Particularmente, prefiro quando a política se baseia mais na razão enquanto a arte se baseia mais na emoção, mas é claro que tanto razão como emoção estão presentes em tudo. A realidade é complexa e não precisamos ter atestado de pureza ideológica de todo mundo que a gente consome. O fato é que é perfeitamente possível, em diversos casos, separar autor e obra em diferentes graus, mas penso que o mais importante, ao se consumir um bem simbólico, é ter em mente que sua interpretação daquilo não é a única verdade sobre aquela obra. Verdades existem aos borbotões. Rubem Fonseca é um escritor genial, a despeito de ter sido um ser humano um pouco mais equivocado que a média (para usar um eufemismo educado). Gostou? Comenta aqui pra gente! A lista citada das 10 Sinfonias que você precisa escutar que publicamos no Topping Toppers está aqui! Se você gosta de artigos sobre literatura, aqui também tem uma lista interessante sobre 10 livros fora da caixinha. Mas se você gosta mesmo de conteúdos políticos, sobretudo os que falam de como a política se infiltra em várias camadas de saber, existem vários na nossa sessão Neurônio Cult! E também um artigo muito interessante de um dos nossos colaboradores em política aqui. Nílbio Thé Editor do site.
- Filarmônica de Viena - As Melhores orquestras do mundo 3
Vamo lá. Não tô indo na ordem de qualidade, de fama, de minha preferência, nem nada. Só vou falar sobre as orquestras dessa lista pra vocês conhecerem mais como operam. Talvez eu fale até de orquestras que não estão na lista. Vamos à maior orquestra da Áustria. A Orquestra A Filarmônica de Viena é uma das 3 maiores orquestras, certamente. Quase tão famosa quanto a de Berlim e tão refinada quanto a do Concertgebouw, é uma orquestra cheia de peculiaridades. Cheia, cheia. A começar pelo fato de não ter um regente titular. Aquele que vai trabalhando o conjunto durante anos, que a faz ter o seu (do regente) som. Um cara pra chamar de "o maestro da Filarmônica de Viena". Não têm. Ela é mais uma instituição. Vamos entender. Os músicos que entram pra Filarmônica são aqueles que mais se destacam em outra orquestra, a da Ópera Estatal de Viena. Tem que passar pelo menos 3 anos nela, tocando ópera e balé (situações em que a orquestra é secundária, mas há grandes conjuntos que fazem isso) para poder fazer um requerimento para ocupar uma eventual vaga na VPO (Vienna Philharmonic Orchestra). Estes músicos são muito valorizados. O violinista Wolfgang Schneiderhan, o flautista Wolfgang Schulz e o clarinetista Karl Leister são só alguns exemplos que alcancaram fama internacional. A orquestra faz sua temporada anual no Musikvereinsaal. Todo ano eles elegem um regente. Por isso, e pelo prestígio que é reger a VPO, todo maestro que você imaginar já passou por lá. Desde Hans Richter e Gustav Mahler, passando por Karl Böhm e Herbert von Karajan, até os talentos modernos Andris Nelsons e Gustavo Dudamel. Eles foram regidos por e estrearam obras de compositores como Johannes Brahms, como suas sinfonias Nos. 1, 2 e 3 (regidas por Hans Richter) e as Variações Haydn (regidas pelo seu próprio punho). Estrearam a 8ª Sinfonia de Anton Bruckner, com o mesmo Richter regendo. O Musikverein A famosa sala de concerto está entre as melhores em forma de "caixa de sapato" do mundo, tanto por sua beleza quanto pela acústica. A sala maior (Großer Saal) acomoda 1.744 pessoas sentadas e 300 em pé. Ainda tem a Sala Brahms e outras 3 menores para recitais e música de câmara. Em 1913 ocorreu o Skandalkonzert (algo como concerto do escândalo), que foi uma apresentação de música moderna regida por Arnold Schönberg, análoga à estreia da Sagração da Primavera, em Paris, que viria a acontecer dois meses depois. Também conhecido como Concerto do Tapa (o organista deu um tapa num membro do auditório), seu repertório chocou o público, e teve de ser encerrado antes do previsto. Era música a expressionista e atonal de Schönberg, Webern e Berg, da qual eu não sou muito fã (mas não quero levar nenhum tapa por isso). A sala também recebe o famoso concerto de ano novo, que é, bem , todo ano. Eles tocam música leve, como as valsas e polkas de Joseph, Johann e Johann II Strauss, bem como obras de Offenbach e outros compositores, geralmente austríacos. As Peculiaridades Os instrumentos pertencem à orquestra, alguns raríssimos, como Stradivarius, Amati e outros. A Filarmônica de Viena afina em 443 hz para a nota lá (o normal é 440). Por que? E eu sei? A primeira mulher a reger a orquestra, Simone Young, o fez em 2005 (é uma instituição, nesse sentido, muito arcaica, tendo até hoje pouco mais de 15 mulheres no seu efetivo). O fagote é tocado sem vibrato. Os trompetes e trombones são menores. Os oboés e as trompas são diferentes etc... Só pra citar algumas coisas que tornam o som dela único no mundo. A Áustria e a cidade de Viena, sua capital, têm muito orgulho da sua orquestra, que é fruto de muito trabalho, alguma doidice e uma longa e bela história. Gravações Importantes - Ludwig van Beethoven - As Sinfonias - regente: Andris Nelsons - uma gravação limpíssima e com o som maravilhoso. - Jean Sibelius - Sinfonias Nº 1, 2, 5 e 7 - regente: Leonard Bernstein - Bernstein, o regente americano mais celebrado do século XX, era um grande sentimental. Ele extraía das orquestras grande expressividade. E eletricidade. - Pyotr Tchaikovsky - Sinfonia Nº 6 (clique para saber mais sobre a sinfonia) - regente: Valery Gergiev - um russo regendo uma das grandes orquestras nessa sinfonia medonha de bela. Não acredito nessa coisa de "só um russo sabe reger um russo". Besteira. Mas acontece algo nessa gravação. - Joseph Haydn - Sinfonias Nos. 94 "Surpresa" e 101 "O Relógio"/Johannes Brahms - Variações Haydn - regente: Pierre Monteux - acreditem, Monteux era um gênio. Nunca vi Haydn regido assim. O Brahms é com outra orquestra, de que ainda falaremos: a Sinfônica de Londres.
- Pitch Meeting legendado 2 - Lua Nova
Segunda parte. Veja a primeira aqui. Compartilho o segundo vídeo que legendei de um canal do YouTube chamado Screen Rant. No canal deles não tem legenda. Mas se gostarem corram lá. * Mal começo = mau começo. Não esqueça de comentar. Não deixe de conferir nossas listas de: Top 10 Sinfonias Top 10 Concertos para Piano Top 10 Sonatas para Piano
- Top 10 das melhores faixas de rock brasileiro: os anos 90!
Depois de uns perrengues dos editores na viagem no tempo aqui, voltamos! E voltamos para os anos 90 e voltamos, claro e mais uma vez com Rodrigo Vargas. Nos encontramos ali com ele no começo dos anos 90 e fomos caminhando conversando sobre o rock brasileiro até 1999 e da conversa veio essa lista de hoje que tem artistas que até hoje estão nas paradas das rádios, festas, playlists e programas de TV. Será que os anos 90 foram tão ótimos assim pro rock brasileiro? Vamos conferir. Top 10 (Rock Brasil 90´s) 10 – Antes Que Seja Tarde (Pato Fu) – banda bonitinha e que vem no embalo do Skank. Não é nada demais mas se surgisse hoje, seria genial. 9 – Jackie Tequila (Skank) – Utilizando o ska (ritmo jamaicano que ganhou o mundo nos anos 90) como estrutura, ganharam as rádios do país e colocaram Minas Gerais no mapa do gênero. 8 – Malandragem (Cassia Eller) – Não costumo reverenciar interpretes. Prefiro autorais pelo conceito de criação artística que sigo mas Eller transcende a arte. 7 – Tudo Que Ela Gosta de Escutar (Charlie Brown Jr.) – Skatistas de Santos, imprimiram um jeito particular de ver o mundo e de brigar por ele. O resultado são músicas arrebatadoras e finais trágicos para suas maiores figuras, Chorão e Champignon. 6 – O Último Dia (Paulinho Moska) – Moska é filhote dos anos 80 com a banda Inimigos do Rei mas foi nos anos 90, em carreira solo que mostrou que era definitivo como artista. 5 – Quem Sabe (Los Hermanos) – Nasceram pop com um disco arrebatador. Tão potente que até o Beatle George Harrison regravou uma de suas canções mais conhecidas, Anna Júlia. Nos anos seguintes embarcou na ideia elitista burguesa e apesar de produzir ótimos discos, soou sempre arrogante e auto suficiente. É tão original que criou uma fissura no rock nacional e até hoje, quase tudo o que surgiu reverbera a sua obra, impondo um abismo criativo em imitadores sem fim. 4 – Adoled (Planet Hemp) – Peso e voz. Uma das bandas mais ativistas de todos os tempos. Lutou pela legalização da maconha. Acabou presa e dividida, mas é sem dúvida um dos marcos daquela geração. 3 – Miséria S.A (O Rappa) – Junta aí todos os elementos cariocas como o morro, o samba, o rap, com um peso absoluto e letras cortantes vindas de um gênio chamado Marcelo Yuka. Uma tragédia interrompeu o sucesso estrondoso que faziam. Um tiro deixou Yuka, na época baterista e letrista paraplégico. A sua saída da banda foi possivelmente tão traumática quanto o crime que sofreu. O grupo continuou sem ele, mas nunca mais foi o mesmo. 2 – Eu Quero Ver O Oco (Raimundos) – Primeira banda de rock da segunda geração de Brasília surgiu com uma originalidade espantosa. Com ritmos nordestinos, letras maliciosas e um peso nunca tão popular no Brasil, tomou conta do cenário. Só foi interrompida pela saída repentina de seu vocalista e líder Rodolfo, que preferiu se tornar um religioso evangélico. 1 – A Praieira (Chico Science & Nação Zumbi) – Um dos grupos mais originais da história do rock brasileiro misturou toda a força nordestina, em um movimento que ficou mundialmente conhecido como Manguebeat. Um acidente fatal tirou a vida de seu líder e criador Chico Science, interrompendo uma trajetória criativa e genial. Gostou? Semana que em a viagem continua! E além disso temos uma lista também do Rodrigo Vargas com o melhor do rock gringo dos anos 90 aqui! Quer saber como essa lista de rock brazuca começa? Ela começa nos anos 70! RODRIGO VARGAS é do mundo. Nasceu em Goiânia, cresceu em Brasília, estudou em Londres e está cearense. Jornalista e psicólogo, teve bandas de rock e atuou como VJ na televisão. Foi apresentador e editor de cultura da afiliada à rede Globo no Ceará. O resto é história!
- Beatles e o Cover de Twist and Shout... espera, você disse cover!?
Você, estimado leitor, certamente já deve ter assistido o filme Curtindo a Vida Adoidado (Ferris Bueller’s Day Off, 1986) e balançado o esqueleto na parte em que Ferris sobe no carro alegórico e faz um Lip Sync de Twist and Shout??? Ou ainda, antes disso, ouviu essa canção naquele LP arranhado de Please, Please Me do quarteto de Liverpool? Pois bem. De forma alguma estou aqui para diminuir a genialidade de John, Paul, Ringo e George. Mas não posso ser negligente na missão de destruir crenças musicais. Claro que estou brincando, mas uma coisa precisa ser dita: Twist and Shout não uma canção original dos Beatles. O ano era 1961. O grupo vocal de rhythm and blues The Top Notes lançou, dois anos antes da versão consagrada mundialmente pelos Beatles no álbum de 1963, no formato de single, a primeira gravação de fato de Twist And Shout (música composta por Phil Medley e Bert Russell), produzida por nada menos que Phil Spector (que viria a produzir ícones como Ike and Tina Turner, Leonard Cohen, Ramones, os próprios Beatles e depois álbuns solo de John e George). Ainda antes de ser gravada pelos Beatles, ela recebeu uma versão pelos The Isley Brothers, muito mais parecida com a consagrada, se comparada com a dos Top Notes. Deixo aqui as 3 versões citadas para apreciação. Top Notes: Abaixo versão de The Isley Brothers. Imagem da primeira fase ainda do grupo e que se parece, visualmente falando, com a foto dos Top Notes. Abaixo a versão mais famosa, dos Beatles, que é comumente tida como sendo a original por muitas pessoas. LEANDRO KRINDGES é Técnico Químico de profissão, licenciado em Biologia por paixão, fã de Foo Fighters a Belchior e de tirinhas, especialmente Peanuts. Sempre teve curiosidade em saber o que se passava por trás das músicas, e essa busca se tornou um hobby. Tecladista da Banda Villa Rock, arranha também violão e guitarra. Aprendeu a gostar de ler depois do Kindle.
- Disco: Preghiera -Trios de Rachmaninoff
A gente ouve várias gravações da mesma peça. No caso dos 2 Trios Élégiaques de Rachmaninoff, a versão de referência, ou ao menos uma delas, é do Beaux Arts Trio. Mas mesmo o grupo dessa formação (violino, violoncelo e piano) mais famoso do mundo não é páreo para quando uma gravadora resolve juntar 3 solistas geniais. É o caso do disco Preghiera, de 2017, que junta o violinista letão Gidon Kremer, a violoncelista lituana Giedre Dirvanauskaite e o pianista russo Daniil Trifonov. Os três simplesmente dominam as peças. O álbum abre com a peça que lhe dá nome: Preghiera é um arranjo de Fritz Kreisler para o segundo movimento do Segundo Concerto para Piano de Rachmaninoff. Ele reduziu para piano e violino (seu instrumento, com o qual chegou a gravar algumas sonatas com Rachmaninoff). É bonito, mas é só o que eu tenho a dizer. Seguimos com o começo propriamente dito. Eles invertem e tocam o Trio Élégiaque Nº 2 primeiro. E com perfeição. É uma peça que tem estrutura de sonata, e é elegíaca (dã), então você não pode sair desse clima meio fúnebre, mas encantado. Quase de oração (Preghiera é oração em italiano, ou me corrijam). Pois bem, do clima eles não saem, fazendo com maestria as pequenas variações de humor presentes na peça. Mas é a expressividade que é marcante. Como o trio é uma formação bem pequena, todos os três têm a oportunidade de brilhar e mostrar sua sensibilidade no fraseado. O compositor escreveu essa peça após a morte de seu amigo e mentor Pyotr Tchaikovsky. A solenidade e a beleza mostram o quanto ele admirava o mestre, que morreu repentina e tragicamente em 1893. Tem 3 movimentos. Por um tempo ele, que era muito autocrítico, não gostava da obra. Até que ouviu uma performance arrebatadora do Trio Moscou: "Vocês me fizeram amar meu Trio!" Curiosamente, é do 1º Trio Élégiaque que eu mais gosto. Ele é em um só movimento, mais curto que cada um dos dois primeiros do Trio nº 2. É uma peça que ele compôs quando era estudante, aos 18 anos. Mas é uma pequena joia. Ele começa com o acompanhamento do violino e do violoncelo, um artifício (abrir a peça com uma figura de acompanhamento) que ele usaria famosamente no 3º Concerto para Piano, muitos anos depois. Aí o piano anuncia a maravilhosa melodia, que servirá de tema principal pela obra. Ela termina com o mesmo tema, mas dessa vez com um verdadeiro acompanhamento de Marcha Fúnebre. Os Trios Elegíacos de Racmaninoff estão entre os mais expressivos e belos da literatura (vasta) para esta formação. Sugiro que você escute e depois me conte o que achou. São obras de uma magnitude e importância enormes.
- Como as orquestras estão lidando com a pandemia?
A pandemia fez o mundo ter que se repaginar. Os artistas fizeram a reconstrução de todo o seu papel (pra não falarmos de empresários, trabalhadores autônomos, professores...) e achar novos meios de se promover, de fazer seu trabalho. Se tem no mundo uma instituição que vive no limite entre a operacionalidade plena e a falência sumária é a orquestra sinfônica. Tomemos o exemplo brasileiro da OSESP (Orquestra Sinfônica Estadual de São Paulo), que é sustentada por uma fundação, pelo estado de São Paulo e pela venda de ingressos. Há uma imensa estrutura em volta da orquestra: pra começar, eles têm mais músicos do que se costuma ver no palco. Eles fazem revezamento. A OSESP emprega desde seu diretor artístico e seu regente até o caixa da lojinha de lembranças. Tem um contrato saudável de gravações, de onde tira mais uma comissão e vários conjuntos de câmara autossustentáveis. A equação é simplérrima, pra ser claro: o que entra tem que ser igual ao que se gasta. Isso significa que se alguma dessas fontes de dinheiro ficar comprometida, haverá problema. O mais óbvio que a pandemia nos trouxe foi a ausência de público. O grupo já voltou a dar concertos, mas, como são uma entidade não negacionista da realidade, toca para um público limitado. Não podem cobrar mais caro pelo ingresso, seria desleal e acho que é literalmente proibido. Então como as orquestras têm feito? A OSESP viu o orçamento R$ 100 milhões de reais, que era o previsto, cair para R$ 74 M. O governo de São Paulo teve que fazer um corte de 14% no repasse para a orquestra. O que os salvou foi a solidariedade do público: tendo comprado ingressos antecipados para concertos que não aconteceram, concordaram não pedir reembolso e doar os valores para a instituição. Os músicos e funcionários concordaram em cortar o próprio salário em 15%. Regentes e músicos têm aceitado cortes antes impensáveis nos seus salários. Os músicos da Orquestra de Filadélfia recebem 75% do seu antigo salário, isso até março, quando eles vão reavaliar. Algumas orquestras simplesmente não estão tendo a temporada 2020-2021, como a Sinfônica de Boston e a Filarmônica de Londres. A Orquestra Metropolitana de Nova Iorque teve perdas estimadas em 100 milhões de dólares e resolveu fechar as portas temporariamente. São tempos difíceis para todos nós. Eu acho que o mundo vai, com o tempo, se acomodar à nova realidade. Vamos passar uns bons anos assistindo a concertos, shows, peças e exposições na tela do celular. Digo anos porque, mesmo quando a pandemia passar, teremos nos habituado a essa nova vida. Um novo mundo polarizado, humilhado, transformado e devidamente sofrido. Só espero que no meio do caminho a música não pare.
- A Mina da Roupa de Borracha #04
Uma história em quadrinhos de Dona Dora. Dona Dora Nascida no Rio e criada na Ceilândia-DF, foi estudante de escolas públicas e formada em Artes Plásticas pela UnB - Universidade de Brasília. Em 2013, passou a produzir quadrinhos participando de eventos marginais ou feiras de coletivos de produção independente Zines. Desde então faz uns desenhos diferenciados, pinta quadros, faz quadrinhos e atualmente dá aula de Artes para o Ensino Médio. Curadoria de quadrinhos: Nílbio Thé e Isabelle Prado.
- A monogamia é a forma cristã de amar.
Em seu artigo sobre a interferência colonial das relações afetivo-sexuais de indígenas, Vania Moreira (2018) comenta que: "Em razão de ser o matrimônio monogâmico um dos sacramentos do catolicismo, a não monogamia impedia a conversão e o batismo dos adultos, comprometendo seriamente o sucesso da obra missionária. Pode-se mesmo afirmar que superar a não monogamia dos índios se tornou uma verdadeira obsessão dos missionários dedicados à evangelização. O combate à poligamia dos índios foi trabalho pastoral intenso e contínuo dos jesuítas no Brasil" A colonização não acabou, nem a cristianização, que é sua essência. A positivação das leis coloniais segue no vocabulário de muitas pessoas que defendem o jeito cristão de amar: monogamia, pra elas, significa amor, profundidade, cuidado, respeito etc. Não monogamia, associam à falta de controle sobre o corpo, a amores falsos, rasos e afins. É o mesmo repertório colonial atualizado. O padre José de Anchieta (1584-1586) em suas cartas comenta que nunca tinha presenciado nenhum indígena assassinando ou agredindo companheiras por adultério. Óbvio, não havia o pressuposto monogâmico. Há quem defenda monogamia saudável ou mesmo revolucionária, como se houvesse um jeito bom dela acontecer. Mas se é assim, se determinada relação não se pauta em posse, controle e cerceamento, porque chamá-la de monogamia? Não existe uma monogamia boa x uma prática ruim de seus preceitos, pois a própria moralidade é o que a organiza. Assim como não existe monogamia escolhida (escolhas só podemos fazer sobre nosso próprio corpo), também não existe não monogamia imposta (pois ela é uma reivindicação sobre si, não sobre o corpo alheio). Uma pessoa pode se relacionar com apenas uma pessoa e ser não mono, pois, repito: não monogamia é sobre não se autorizar a legislar desejos e afetos alheios. A autonomia afetivo-sexual é um direito (que deveria ser) intransferível. Algo ser combinado ou acordado não significa que é ético e não é ético combinar a terceirização da sua própria autonomia. Geni Núñez Ativista indígena. Psicóloga e amante do pensamento artesanal. Membro da articulação brasileira de indígenas psicólogos.
- Reunião de Roteiro - Crepúsculo
Compartilho um vídeo que legendei de um canal do YouTube chamado Screen Rant. É só entretenimento, tá, gente? No canal deles não tem legenda. Mas se gostarem corram lá. A situação é a de que um roteirista vai apresentar o roteiro ao produtor (o mesmo ator faz os dois). Quando você se acostuma, que tudo é irônico, você termina o vídeo pensando no tanto de furo que tem no roteiro do filme em questão. Começemos com Crepúsculo. Não esqueça de comentar. Não deixe de conferir nossas listas de: Top 10 Sinfonias Top 10 Concertos para Piano Top 10 Sonatas para Piano
- O Que Aconteceu Antes da Foto ou a música que não foi
Conversa no WhatsApp entre mim e o Nílbio. Nílbio - Eu vejo essa foto e lembro do que aconteceu antes e morro de rir!😂😂😂 Rafael - O que foi? Tu não sabe a história? Não. Tu lembra que o caetano e o chico tinham um programa de tv? Sim. Certo Aí um belo dia, aproveitando uma turnê do Piazzola no Brasil ele foi convidado pro programa deles Daí Chico chegou no ouvido do Caetano e disse Pega a visão, o Piazzola um tempo atrás me mandou uma melodia. E me pediu uma letra. Se liga, foi numa noite de bebedeira ali pelo café Tortoni, depois que chegamos de uma noitada lá no caminito da vez que fui lá. Ele talvez nem lembre. Eu mesmo só me toquei agora Continuo, Chico, estou estimulado com essa história, disse a caetano Então Caetano... Daí eu pensei no seguinte: eu bato um fio pro Piazzola lá no hotel e combino com ele. Faço a letra e daqui uma semana quando a gente for fazer o programa a letra vai tá pronta e a gente faz ela no programa. Inédita Puxa Chico... ontem eu me perguntava o que você pensava de mim. Se você gostava de mim e agora você fala essa coisa linda. Você é lindo, Chico. Você deu o furo do programa. Que furo lindo esse seu Aí Chico chegou em casa. Tomou um uísque com Marieta e bateu o telefone pro Piazzola Daí o Piazzola atendeu ¡Hermano Chico! ¡Me gusta muchissimo tu llamada! Daí o chico mandou a real e fez o hermano Astor lembrar a melodia Hermano Astor chega ficou de p... duro com a promessa que em uma semana teria uma parceria que abalaria o cone sul. Toda aquela latinidade Hermano Astor passou uma semana treinando a música enquanto irmão Chico teve um bloqueio criativo. Acontece que toda a mpb já tava sabendo desse rolê do mercosul da música pq num ensaio com os Doces Bárbaros o caê mandou a visão pra Gil, Bethania e Gal. Alguém falou pra Paulinho da Viola, Tim Maia que contou pro Nelson Motta de modo que rolou uma energia. Aí claro que alguém teve a ideia de chamar o Jobim pro programa para garantir o fornecimento de energia artística cósmica para o continente porque realmente era muita energia envolvida numa parceria Buarque-Piazzola. Daí ficou acertado que no programa ia ter o Caetano, o Chico e o Tom ciceroneando o hermano Astor como atração principal. Daí Que NO DIA DA GRAVAÇÃO o hermano chega com o bandoneon emocionado já tocando a melodia desde a entrada no prédio dos estúdios e dançando uns passos de tango. E o no camarim o zói de bila chega no hermano e diz "não deu". Acontece que o hermano era a condensação da latinidade. E já abalado pela perda das Maldivas para a Inglaterra ele não contou pipoca e partiu pra cima do Chico. TÁ ACHANDO QUE EU SOU O BOB MARLEY, CAR()$HO!? PAZ E AMOR? NEM FUTEBOL EU JOGO. MEU DESPORTO É O BOXE! EU VOU JOGAR ESSES OLHO VERDE NO MAR, SEU C&*ÃO (claro que tudo isso em espanhol) E partiu pra cima Tom Jobim que apartou os ânimos culturais do cone sul , provavelmente contou alguma história da Violeta Parra ou da Mercedes Sosa ou ainda um grane segredo de Frank Sinatra e aí todo mundo se acalmou e foi na hora que - provavelmente o Nelson Motta chegou e - bateram essa foto que eu não sei quem tirou, mas como disse: não duvido do Nelson. Rafael - Achei fofa a maneira fragmentada e espetacular com que tu contou a história.
- Filarmônica de Berlim - As Melhores Orquestras do Mundo 1
Vou falar um pouco sobre cada orquestra dessa lista. E outras. Conhecer uma orquestra é como conhecer um sotaque. Seu som é tão próprio que, às vezes, dá pra identificar. Os especialistas identificam qual orquestra está tocando em poucos segundos. Eu não vou tão longe: identifico se é inglesa, russa, americana, germânica... Mas não foi planejado. Foi consequência de escutar muita música. E tem certas orquestras que dá mesmo pra destacar várias características e, a partir destas, ir afunilando as possibilidades até que você tenha certeza de qual está tocando. É o caso da primeira dessa série, a Orquestra Filarmônica de Berlim. A Alemanha tem tantas orquestras fantásticas (só em Berlim, eu lembro de 4) que é uma proeza uma delas ser considerada a maior. A BPO (Berliner Philharmoniker) consegue ser a orquestra mais famosa e, em muitos aspectos, a melhor do mundo. Começa com o orçamento: um músico dela ganha, em média 9 mil euros por mês só de salário. Ganham ainda comissões por gravação e por seus trabalhos como cameristas - a orquestra incentiva que seus músicos façam música de câmara. Isso faz com que cada vaga seja disputadíssima e que cada músico contratado seja de absoluta competência. Músicos de destaque Veja o exemplo de três solistas. Daishin Kaishimoto, um jovem violinista japonês, que é simplesmente o spalla (principal violino) da orquestra, já gravou como solista (em concertos para violino, existe um violinista principal, que fica em pé, além dos pra lá de 20 violinos normais da orquestra). Ou seja, quando não está sendo o spalla da maior orquestra do mundo, está sendo solista. Gravou o concerto de Brahms com Myunh-Whun Chung e a Staatskapelle de Dresden (outra orquestra fenomenal) e tem um contrato com a Sony. Emmanuel Pahud, flautista suíço que faz sucesso desde os anos 90, é uma das estrelas da BPO. Chegou a abandoná-la nos anos 2000, mas voltou e é o primeiro flautista do conjunto. Pahud tem uma relação muito boa com a Orquestra Sinfônica Estadual de São Paulo, tendo sido artista residente na década que graças a deus se passou. Além de ter vários discos gravados e ser um dos flautistas vivos de maior reputação. Andreas Ottensamer, este muito jovem (31), é o primeiro clarinetista da orquestra. É uma das estrelas da vez. Seu pai, Ernst, teve o mesmo cargo na Filarmônica de Viena, que hoje é ocupado por seu irmão Daniel. Tem gravado profusamente, lançando discos com Yuja Wang e como solista na própria BPO. Maestros Os maestros são um capítulo. Entre 1882 e 1922, seus regentes principais foram Ludwig von Brenner (1882–1887), Hans von Bülow (1887–1893), Richard Strauss (o compositor) (1894–1895) e Arthur Nikisch (1895-1922). Um começo extraordinário, com ênfase em Nikisch, que trabalhou com ela por mais de 2 décadas e era considerado o maior regente de então. Mas eis que assume Wilhelm Furtwängler (1922-1945). Ele dirigiu a orquestra no começo da era das gravações e nos deixou várias, que são consideradas um tesouro. Furtwängler era um maestro altamente idiossincrático, falava pouco nos ensaios, regia lento e sem precisão, tomava várias liberdades com a partitura, especialmente no que diz respeito aos andamentos; mas tirava um som único. É do tipo que ou você ama ou detesta. Logo depois dele, Sergiu Celibidache regeu a orquestra por 7 anos até que Furtwängler voltou por mais duas temporadas, terminando em 1954. Agora vejam, de 1954 até 1989, a orquestra só teve um regente. Ninguém menos que Herbert von Karajan. Ele assumiu a orquestra jovem e só saiu porque morreu. A Era Karajan é marcada pelas seguintes características. A sonoridade, a afinação, o equilíbrio (entre sopros e cordas) eram perfeitos. Perfeitos como nunca um regente havia feito. Isso tinha um custo. Alguns críticos acusavam (e eu, mesmo fã de Karajan, concordo) a orquestra de só ter um som. Pouca variedade, pouco colorido. Sonoridade engessada. Essa sonoridade funcionava muito bem, na minha opinião, em Beethoven e Brahms. Nos românticos em geral. Quando chegava no impressionismo, realmente faltava um pouco de fluidez. Mas isso é ínfimo, não quer dizer que eles tocavam mal Debussy. Apenas eram mais adequados à produção de um som mais duro. Eles gravaram, no tempo de Karajan, praticamente tudo que se tinha pra gravar. Gravavam, por exemplo, as sinfonias de Beethoven nos anos 60, daí nos anos 70 a tecnologia mudava e eles gravavam de novo. E de novo nos anos 80 para CD. Ele era famoso como um pop star. E vendia como um. Outra sacada de mestre foi o VHS. Eles eram a orquestra mais filmada, sem dúvida. E lançavam as fitas, e depois, DVDs. Aí a gente ia se familiarizando com os músicos e com o maestro. Depois mudariam de estratégia, mas eu falo disso mais pra frente. Mas eis que ele morre e fica aquele grande mistério: quem os músicos vão escolher para ser seu próximo regente? Daniel Barenboim, o famosão, era cotado. Assim como Ricardo Muti, o galã. Parecia a espera do anúncio do papa. E eles acabaram elegendo o discreto Claudio Abbado, com uma certa surpresa geral. Abbado tinha feito importantes gravações sinfônicas, tinha trabalhado com a Sinfônica de Chicago, a Sinfônica de Londres, a Filarmônica de Viena. Tinha afinidade com um repertório vastíssimo, que ia desde a música barroca até a contemporânea. Então foi ele, nos anos 90, que se encarregou de mudar no que Karajan tinha falhado, mas mantendo o que ele conquistara - era a orquestra mais famosa do mundo não por acaso. E ele trouxe muita música nova, como a de seu amigo, compositor Luigi Nono. Claudio Abbado deixou a orquestra no fim do seu contrato, em 2002. Lutava à época com um câncer. Em 2004 voltou a regê-la como convidado. Morreria em 2014. Pois o seu titular pelos anos 2000-2010 seria, surpreendentemente, o inglês Simon Rattle. Rattle é mais um acontecimento do que um regente. Não que ele não seja musicalmente bom. É competente. Mas onde ele chega, ele muda as coisas. Tinha trabalhado antes na Sinfônica de Birmingham e transformado-a em uma orquestra de alto nível, construindo uma sala de concerto de respeito. Em Berlim ele fez performances dramáticas de oratórios de Bach (dramáticas, mesmo, com atores), trazia música moderna, levou a orquestra em uma turnê asiática. E nessa época eles resolveram fazer um app. Sei que você releu, mas é um app, mesmo. Falo mais abaixo. Pois bem. Em 2019 eles anunciaram que começariam a trabalhar com um novo regente. O eleito foi Kirill Petrenko. Um regente ainda jovem, com uma discografia pequena. Com a pandemia, ainda não dá pra avaliar nada de como a orquestra se comporta com ele. Mas, sem dúvida, é um talento. Digital Concert Hall Em 2008, eles lançam o Digital Concert Hall, que basicamente é a Netflix da BPO. Você assina, baixa o app e pode assistir a milhares de concertos e documentários. E pode assistir aos concertos que estão acontecendo, ao vivo (que, depois, são adicionados à biblioteca). Além disso, eles disponibilizam os famosos vídeos da orquestra da época de Karajan e de Abbado. Já notou como é difícil ver vídeos de obras completas da orquestra no YouTube? Estão todos no app. A Philharmonie Toda orquestra de peso tem uma casa de concertos à altura. A Philharmonie, inaugurada em 1963, tem 2 salas: a maior, onde a orquestra se apresenta, acolhe 2.440 pessoas; a menor, dedicada à música de câmara, 1.180. Anteriormente a Filarmônica tocava na velha Philharmonie, que foi destruída na guerra. E aí está o perfil da "Maior Orquestra do Mundo". Pra ficar claro: a BPO, a Filarmônica de Viena e a Orquestra do Concertgebouw de Amsterdã costumam alternar, ano a ano, as três primeiras posições nesse quesito. Comente o que achou. Já experimentou o aplicativo? Gravações Importantes - Ludwig van Beethoven - Sinfonia Nº 6 "Pastoral" /Carl Maria von Weber - Abertura Der Freischutz / Maurice Ravel - Suíte Nº 2 de Daphnis et Chloé - regente: Wilhelm Furtwängler - uma gravação de um concerto de 1944, simplesmente sublime. Dapnhis et Chloé elétrica, Pastoral plácida e Freischutsz preciso. Lembre-se que as gravações ao vivo de Furtwängler na guerra, em Berlim, eram super carregadas. As pessoas choravam e se emocionavam muito. - Ludwig van Beethoven - As Sinfonias e Aberturas - regente: André Cluytens - atenção às aberturas. Também à 5ª Sinfonia, da qual ele tira muita energia e à 6ª, que parece outra orquestra. - Ludwig van Beethoven - As Sinfonias - regente: Herbert von Karajan (anos 80, que tem um som melhor que as gravações das décadas anteriores e igual valor artístico) - atenção às sinfonias Nº 3 e 5. - Gustav Mahler - Sinfonia Nº 7 - regente: Claudio Abbado - das gravações de Abbado, pelo menos com a BPO, esta é a que mais me cativa, mesmo não gostando muito de Mahler. Mas é difícil escolher, ele me agrada em tudo. - Franz Liszt - Concertos para Piano Nos. 1 e 2 / Sergei Rachmaninoff - Concerto para Piano Nº 2 - regente: Leopold Ludwig, pianista: Andor Foldes - três gravações maravilhosas desse pianista que precisa ser mais apreciado. - Pyotr Tchaikovsky - Sinfonia Nº 6 "Pathétique" - regente: Kirill Petrenko - belamente tocado e regido como quem ainda está tateando sua nova orquestra, o disco mostra uma das melhores gravações de Tchaikovsky por um regente russo. A Filarmônica está surpreendente.
- Música Calada - A Arte de Federico Mompou
Claude Achille Debussy, o grande compositor francês da virada do século XIX para o XX, talvez tenha sido o compositor mais influente de sua geração. Até mais que Stravinsky e Schoenberg. Porque seu estilo não ditava regras, ele removia regras. Ele mesmo foi influenciado por outros, obviamente. Especialmente por Erik Satie, um compositor estranho. Devia vir junto com o nome dele: Eric Satie, um compositor estranho. O que Eric tinha era uma escrita esparsa, como manteiga espalhada sobre muito pão (referência nerd)... O que não significa que não tivesse densidade. Você só tinha que esperar mais pra ver essa densidade. Mas depois eu falo sobre Satie. Debussy herdou muito das texturas dele (ambos escreveram muita música para piano, e é a ele que me refiro aqui). Os acordes eram tonais, ou seja, tinham nome, mas eram carregados de dissonâncias "agradáveis". A forma final do impressionismo musical foi dada por Debussy. Ele detestava esse termo, mas não tinha como fugir dele. Sua música era mais uma sucessão de sensações do que uma narrativa clara. Heitor Villa-Lobos teve sua fase emulando o impressionismo. Obras como "A Prole do Bebê", livros 1 e 2, são repletas de atmosferas fantásticas e pianismo quase orquestral, em suas cores. O compositor Federico Mompou (1893-1987) foi muitas vezes chamado de Debussy catalão. Não sei se ele gostava, mas ele também não tinha como fugir do epíteto. Sua obra para piano é delicada, meio mística e muito charmosa. Morou na juventude em Paris, onde conviveu com Debussy, Ravel e Satie. Na II Guerra, voltou a Barcelona. Vim falar da sua Musica Callada, uma série de 28 preludiozinhos para piano composta entre 1959 e 1967. O que seria uma música silenciosa? Bom, começando a ouvir, já se tem uma ideia. Ela tem notas, mas parece se valer do silêncio entre elas de maneira mais assertiva. Parece que a música tem um segredo. Não que seja um segredo musical, mas a personalidade dela é como a de alguém que tem um segredo. Por falar nisso, algumas têm codigozinhos musicais, mesmo. Uma melodia da qual, se você tirar algumas notas, faz inesperado sentido tonal, por exemplo. Aliás isso é recorrente nas peças: ele às vezes escreve um simples arpejo e enxerta 2 notinhas dissonantes que fazem toda a diferença. O título ele retirou de um poema de San Juan de la Cruz: La noche sosegada En par de los levantes de la aurora, la música callada. La soledad sonora la cena que recrea y enamora O poema, que é enorme (isso é um trecho), fala sobre a necessidade de encontrarmos a nossa música interna, que emana do silêncio. Mompou foi gravado por grandes pianistas, como Guiomar Novaes, Alicia de Larrocha, mais recentemente, Arcadi Volodos, Daniil Trifonov e Stephen Hough. Mas existe uma gravação que não tem preço (aliás, acho que tem), que é do próprio compositor tocando os 4 livros de sua Musica Callada. Vou deixar o link do Spotify. Escutem e divirtam-se. https://open.spotify.com/album/0afR50oLPpYbh8MsCUJYpr?si=UpM_g8EGRgqsybiquil7yA
- Música: Nada - para Camila Pitanga e Domingos Montagner
Pensei em compartilhar com vocês essa música que eu fiz em que o eu lírico é a Camila Pitanga, falando ao Domingos Montagner. Não vou contar a história porque todo mundo conhece e eu não tenho nada a acrescentar. Só Nada. Por favor, entendam que a gravação foi feita aqui em casa, gravei todos os instrumentos e as vozes, então a qualidade não é das melhores. Nada Eu, tu e o rio, nada Pois ninguém viu nada Vem devagar, nada Meu coração Nada Eu tão fascinada Eu, que de danada Não pressenti nada Vem, por tudo Nada Minha história é só mais uma No São Francisco rabiscada Foi a nossa novela Mas sei que o rio não me deve Nada Pelo amor de nada Água amotinada Desafortunada Só te peço Nada Era maravilhoso nós dois No São Francisco à toa Mas naquela hora nunca Desejei tanto ver canoa Pude fazer nada Vida ali é nada No fim da jornada Pela água Nada Até hoje Nada No meu peito... 15.12.2020 Veja a música que eu fiz para a minha filha, Beatriz - Choro Dela
- Top 10 Discos de Tom Jobim
A discografia de Tom Jobim é relativamente pequena. Alguns de seus melhores discos ele fez com a Banda Nova, um conjunto que ele montou e que constava com Danilo Caymmi (flauta e voz), Paulo Jobim (violão), Jaques Morelembaum (violoncelo e alguns arranjos), um grupo de vozes femininas, bateria e baixo. Ele ao piano e cantando a maior parte das músicas. A voz de Tom Jobim tem duas características, pra mim. Não era muito boa, tecnicamente e timbristicamente, mas ao mesmo tempo, era aconchegante. Lembrava muito meu avô cantando bossas quando eu era criança. Então talvez só eu goste dela. Ou outras pessoas com experiências semelhantes. Antônio Carlos Brasileiro de Almeida Jobim era natural do Rio de Janeiro. Cidadão do mundo, acho que ele cunhou esse termo aqui no Brasil. Foi o compositor brasileiro de maior sucesso no exterior até hoje. Foi gravado por todos os jazzistas. Ella Fitzgerald, Frank Sinatra e Diana Krall fizeram discos inteiros dedicados à sua obra. Criou, junto com João Gilberto, a bossa nova, que era mais do que um ritmo, era um jeito de cantar, de tocar violão, de fazer a bateria, de compor, fazer letra etc. Tom faleceu em 1994 de câncer, doença contra a qual muito lutou. A Banda Nova, ativa por 10 anos, se dissolveu então. Aos discos. Atenção, dei prioridade aos de estúdio em que ele toca principalmente músicas suas. 10. Terra Brasilis (1980) O problema de visitar a discografia de Tom é que ele não gravou as músicas de maneira linear. Canções compostas pra aquele álbum. Pelo menos não necessariamente. O disco duplo Terra Brasilis, por exemplo, abre com a versão em inglês de Vivo Sonhando, que é Dreamer, bem anterior a ele. Guardem essa informação, porque vai ser importante: ele não compunha álbuns, mas gravava o que lhe dava na telha. Continuando, temos a linda Canta, Canta Mais, dele e do Vinícius, outra bem antiga, e que ele gravaria com mais autoridade mais tarde. Olha, Maria é parceria tripla de Tom, Chico Buarque e Vinícius de Moraes. Chico havia gravado em seu disco Construção, de 1971. Aqui, Tom grava só instrumental, o que eu acho que funciona perfeitamente, porque mesmo desprovida de sua letra monumental, a música é absurda. Temos várias regravações, como Samba de Uma Nota Só, Dindi, Quiet Nights of Quiet Stars (Corcovado), Desafinado, Wave. Tudo muito bom. Esse disco é perfeitamente bom. Não é super profundo, mas é absolutamente agradável! 9. O Tempo e o Vento (1985) O disco da trilha sonora da série da Globo, baseada na série dos meus livros favoritos, O Tempo e o Vento, de Érico Veríssimo, uma saga gaúcha. Ele nos trouxe como tema principal Passarim, uma das músicas mais charmosas do Tom e que, depois, daria origem a um álbum inteiro. Tem músicas instrumentais e muitas das faixas não são cantadas por ele, por exemplo, Rodrigo, Meu Capitão e Senhora Dona Bibiana, cantadas por Zé Renato. Mas é um disco de climas, é um daqueles que você escuta sempre do começo ao fim. 8. Matita Perê (1973) Tom Jobim se interessava muito pela mata, pelos passarinhos e pelo folclore brasileiros. Esse disco, que abre com Águas de Março, tem muito da alma brasileira. Pra ficar claro, não é o Jobim americano de que tantos tanto reclamaram. É o Tom saudoso, quase uma versão popular do Villa-Lobos. Não que o disco seja extremamente nacionalista, mas é um dos primeiros discos em que ele canta sobre os próprios interesses. Ele levaria a brasilidade a extremos num disco que veremos mais à frente. Matita Perê tem a belíssima Ana Luiza, que eu acho que deveria ser tão popular quanto Lígia. A faixa título, composta com letra de Paulo César Pinheiro, tem mais de 7 minutos, fazendo longas jornadas tonais. É uma das músicas mais impressionantes do maestro. O disco tem poucas e longas faixas, o que o torna mais interessante para nós músicos, talvez. 7. Inédito (1995) Esse disco tem um nome irônico, já que não apresenta uma única melodia que já não tivesse sido gravada antes. Ele foi gravado sob patrocínio de uma empresa (aquela que não devemos nomear), em 1987, que queria fazer um apanhado da carreira do compositor. Só em 1995 ele foi lançado para o público em geral. Tom dizia que foi o disco em que ele mais se divertiu ao gravar. É todo com sua banda, muito entrosada, nada de convidados ("chega de convidados" ou algo assim). E gravado em casa. Temos Wave, Desafinado, Garota de Ipanema (muito bom arranjo), Retrato em Branco e Preto, Sabiá, Samba do Avião, Estrada do Sol, Águas de Março e muitas outras em arranjos camerísticos (temos algumas poucas cordas) que funcionam muito bem. Eu cresci ouvindo esse disco, lançado quando eu tinha 14 anos, daí meu favoritismo. Danilo Caymmi canta lindamente a Modinha de Villa-Lobos. 6. Passarim (1987) Passarim parece inaugurar essa nova fase do Tom. A fase à qual pertencem o disco anterior da lista e Brasileiro. O Tempo e o Vento já nos tinha apresentado a faixa título, mas aqui ele mostra a forma final dela. Bebel é mais uma canção derramada e linda sobre um personagem feminino. Anos Dourados tem a participação do seu co-autor Chico Buarque, amo essa canção como, de fato, todas as dessa parceria. Luiza, a canção ideal, aparece com uma tonelada de reverb, coisa dos anos 80. Mas está linda. Temos ainda Borseguim, Gabriela, uma interpretação maravilhosa de Fascinatin' Rhythm, de George e Ira Gershwin... É um disco maravilhoso nessa nova era com arranjos menos monumentais e Villa-Lôbicos, tendendo mais a valorizar a banda, seus cantores e suas cantoras. 5. Urubu (1976) Esse é o disco nacionalista do Tom Jobim. A começar pelo berimbau que abre o disco na canção O Boto. A orquestra parece querer tomar o campo, às vezes, com a eloquência, agora sim, de Villa-Lobos. Não são cordas discretas como nos seus discos futuros, mas madeiras e metais tocando elementos rítmicos que são concebidos como parte das canções. São os arranjos sensacionais de Claus Ogerman. Lígia é, como sabemos, uma das mais belas melodias do Tom, assim como é Ângela. Correnteza tem um lindo arranjo, pra variar. Saudade do Brasil é uma música que podia ser do Villa. Sinfonicamente linda, ela parece que fala de ter saudade de uma coisa em que você está, não como se ele estivesse fora do Brasil cantando sua saudade, mas dentro. 4. Edu & Tom/Tom & Edu (1981) Esse é o disco que eu menos escuto dentre os dessa lista. O que não significa que eu não conheça sua importância e sua qualidade. Apenas não costumo ouvir muito. Mas tem uma maravilhosa Pra Dizer Adeus, de Edu Lobo e Torquato Neto; uma agradável Chovendo na Roseira; a gravação definitiva de Vento Bravo; tem ainda Ângela, Luiza, Canto Triste etc. O disco é mais cantado pelo Edu, com Tom fazendo aquelas suas típicas intervenções. É obrigatório, porque aqui se juntaram dois gênios compositores tocando suas maravilhosas canções. 3. Elis & Tom (1974) Elis & Tom é um álbum feliz. Feliz e triste. Porque ela sabia cantar as duas coisas como ninguém. E aqui ela está cantando o maior compositor do nosso tempo. Os arranjos tinham tudo pra ficar datados, mas não aconteceu isso. O disco é bem atemporal. Além da antológica interpretação de ambos de Águas de Março, temos gravações imortais de Por Toda a Minha Vida, de Pois É (muito difícil de cantar, com uma harmonia magistral), Só Tinha Que Ser Com Você, O Que Tinha Que Ser e muitas outras. 2. Francis Albert Sinatra & Antonio Carlos Jobim (1967) Frank Sinatra era o homem que tinha mais facilidade em cantar na música americana de sua geração. Ele não costumava dedicar álbuns inteiros a um compositor, mas abriu uma exceção para o Tom. Tá certo que o disco contém umas músicas que não eram dele, mas são poucas. Os dois estão à vontade. Ou o Tom pelo menos parece (já li que ele estava nervoso à beça). Garota de Ipanema, Dindi, Quiet Nights of Quiet Stars, How Insensitive, e Once I Loved estão impecáveis na voz do Sinatra. Tom toca violão no disco, coisa que ele gostava de evitar, preferindo o piano. Achava muito latin lover a imagem de um brasileiro tocando violão. 1. Brasileiro (1994) Esse é o disco. Maravilhoso da cabeça aos pés. Tá, tenho que confessar que não gosto de três músicas. São elas Maracangalha, Maricotinha (ambas de Dorival Caymmi) e Pato Preto. Mas tem muita coisa maravilhosa. Insensatez com Sting! Querida! As instrumentais Surfboard, Meu Amigo Radamés e Radamés y Pelé. Sensacionais! Ainda tem uma tradução para inglês e interpretação de O Trem Azul, de Lô Borges e Ronaldo Bastos, uma fantástica Chora Coração e o lindo Samba de Maria Luiza. Dentre os discos de Tom Jobim, é o que soa mais refrescante e moderno. Não à toa. Foi o último que lançou em vida. Depois teria o póstumo Inédito, de que já falei, mas pode-se dizer que esse álbum encerra de maneira maravilhosa a discografia do maior compositor de canções brasileiro dos nossos tempos. Também fecha o arco de personagem do Jobim: por fim ele nos traz um álbum conciso, pensado como uma obra só. Façamos algumas menções honrosas e justifiquemos suas ausências. Getz/Gilberto - veremos numa futura análise discográfica de João Gilberto. Esse eu não incluí porque a participação do Tom, ainda que considerável, não lhe confere autoridade sobre o álbum. Miucha & Antônio Carlos Jobim - excelente disco, só que tem poucas músicas do Tom. Jobim Sinfônico - disco da OSESP com obras orquestrais do Tom, é espetacular, mas foi feito bem depois de sua morte. Não acho que seja um disco dele. A Certain Mr. Jobim - se esse fosse um TOP 11, ele entrava. É um belo disco.
- Ave Rara - Argonautas e Marco Forte Interpretam Edu Lobo
Mais uma do nosso disco Argonautas Interpretam Edu Lobo. Você pode escutá-lo completo aqui. Dessa vez chamamos o super cantor cearense Marco Forte para a voz. Marco Forte voz Rafael Torres violão e arranjo Ayrton Pessoa piano Ednar Pinho baixo Luiz Orsano percussão Ave Rara (Edu Lobo e Aldir Blanc) Minha vida peregrina Vai em busca de você Como se eu fosse um malê E você fosse a revelação Do poente vem teu canto Ave rara do islã Quem é pedra como eu sou Bebe a água do amanhã Ah! Tanta sede é meu destino Esse amor é beduíno E oásis teu lençol Mas, sempre no fim da viagem Você volta a ser miragem Areia e Sol Deixe seu comentário e veja as outras músicas do disco! Meia-Noite Opereta de Casamento A Moça do Sonho A Permuta dos Santos
- Top 10 das melhores faixas de rock brasileiro: os anos 80!
Nossa viagem pelo rock brasileiro continua chegando aos anos 80, época considerada por muitas pessoas como a era de ouro do rock nacional com a explosão do pós-punk / new wave em São Paulo em Brasília e também o surgimento de bandas descontraídas e cheias de deboche (e por que não dizer desbunde também) além de da entrada no circuito fonográfico e radiofônico de bandas de outras cidades fora do eixo já conhecido Rio - São Paulo, como Porto Alegre. 10 – Até Quando Esperar (Plebe Rude) – Punk rock brasileiro na sua origem. Mais uma banda de Brasília que desponta e abre caminho para uma consciência mais politizada do gênero. 9 – Rebelde Sem Causa (Ultraje a Rigor) – Sarcástico e bem humorado ganhou rapidamente espaço. Letras bem escritas e harmonias eletrizantes tomaram de assalto as rádios do Brasil. 8 – Weekend (Blitz) – Filhote do funk rock e do que muitos chamam de "world music" abocanhou o público de todas as gerações e marcou um período do pop criativo, teatral e talentoso. 7 – Decadance Avec Elegance (Lobão) – Genial e instável. Lobão começou como baterista da Blitz e acabou ganhando a carreira solo e se consolidando como uma das vozes mais atuantes do rock até hoje. 6 – Ando Só (Engenheiros do Hawaii) – Fora do eixo Rio-São Paulo, os gaúchos abriram caminho para outras bandas talentosas do sul como o Nenhum de Nós. Gessinger é completo! Um dos maiores letristas do rock brasileiro de todos os tempos, também é multi-instrumentista e o vocalista inconfundível desse super grupo que na verdade é ele. 5 – Fullgás (Marina) – Irmã do poeta Antônio Cícero, escreveu em parceria as letras mais profundas do rock nacional. Suas músicas tem além de poesia, uma completude instrumental que ora é sentida por um baixo pulsante, ora por um solo de guitarra desconcertante. 4 – Caleidoscópio (Paralamas do Sucesso) – Esse power trio é o mais completo da história do rock nacional. Guitarra, baixo e bateria impecáveis! Herbert Vianna, Bi Ribeiro e João Barone. 3 – Sete Cidades (Legião Urbana) – Renato Russo é o maior líder do rock nacional. A sua liderança ultrapassou a fronteira da Legião Urbana e tomou conta de toda as gerações que se seguiram até a sua morte. 2 – Por Que a Gente é Assim (Barão Vermelho) – Cazuza e Frejat mudaram a trajetória do rock nacional. Nunca o blues fez tanto sentido no Brasil. Nunca o blues teve letras tão bem trabalhadas e poesias magnificas. Até então! 1 – O que (Titãs) – Super banda de tamanho e de talento. Eram tantos seus lideres que ao longo dos anos foi se desmontando e mesmo assim, sobreviveu. Original, utópica e punk. Arte e agonia! Gostou? Semana que em a viagem continua! Se você gosta mesmo dos anos 80 tem um artigo sobre rock russo com uma ótima banda dos anos 80: a Kino! E além disso temos uma lista também do Rodrigo Vargas com o melhor do rock gringo dos anos 80 aqui! RODRIGO VARGAS é do mundo. Nasceu em Goiânia, cresceu em Brasília, estudou em Londres e está cearense. Jornalista e psicólogo, teve bandas de rock e atuou como VJ na televisão. Foi apresentador e editor de cultura da afiliada à rede Globo no Ceará. O resto é história!
- Argonautas e Mônica Salmaso - Biscate
Encontro maravilhoso dos Argonautas com a Mônica Salmaso. De todas as músicas do repertório para o show no Teatro RioMar Fortaleza, em 2018, essa foi talvez a única que eu sugeri. Ela adorou. Disse que nunca tinha cantado Biscate antes. Composta por Chico Buarque e cantada por ele e Gal Costa no disco Paratodos, de 1993, essa música é um achado. Pra mim é um exemplo fantástico de contraponto na música popular. Porque no final as duas melodias - ele e ela - se juntam e dá bem certinho. Eu nunca tinha cantado em pé. Mas faz sentido. Como disse o Nílbio, é um ato de gentileza se levantar para a dama das damas. Mônica Salmaso - voz e percussão Rafael Torres - voz Ayrton Pessoa - violão Ednar Pinho - baixo Igor Ribeiro - bateria Biscate (Chico Buarque) Vivo de biscate e queres que eu te sustente Se eu ganhar algum vendendo mate Dou-te uns badulaques de repente Andas de pareô, eu sigo inadimplente Chamo você pra sambar Levo você pra benzer Fui pegar uma cor na praia E só faltou me bater, é Basta ver um rabo de saia Pro bobo se derreter Vives na gandaia e esperas que eu te respeite Quem que te mandou tomar conhaque Com o tíquete que te dei pro leite Quieta que eu quero ouvir Flamengo e River Plate Faço lelê de fubá Faço pitu no dendê Sirvo seu pitéu na cama E nada dele comer, ai Telefone, é voz de dama Se penteia pra atender Vamos ao cinema, baby Vamos nos mandar daqui Vamos nos casar na igreja Chega de barraco Chega de piti Vamos pra Bahia, dengo Vamos ver o sol nascer Vamos sair na bateria Deixe de chilique Deixe de siricotico