A última obra publicada do francês Paul Dukas (1865-1935) (o compositor de O Aprendiz de Feiticeiro), de 1911, foi La Péri, um poema dançado (um balé). Coreografado por Ivan Clustine, foi comissionado pelo incansável Serge Diaghilev, dono da companhia de balé Ballets Russes. A premiére, no entanto, não foi dada pela companhia. Diaghilev achava que Natalia Trouhanova, que seria a personagem Peri, não estava à altura de Vaslav Nijinsky, que viveria Alexandre, o Grande.
Natalia providenciou, então, uma coreografia e estreou o balé em 1912, no Théâtre du Châtelet, Paris. Sendo uma peça curta (18 minutos), foi apresentada junto com outros balés, todos regidos pelo compositor.
O compositor
Paul Dukas viveu rodeado por compositores do Impressionismo Francês. Mas ele era relutante em se integrar a alguma corrente. Ele não demonstrou nenhum talento especial para a música até os 14 anos, quando, ao se recuperar de uma doença, começou espontaneamente a compor. Aos 16 entrou para o Conservatoire de Paris. Foi colega de Claude Debussy, de quem se tornaria um grande amigo. No conservatório, suas habilidades musicais afloraram, e ele ganhou diversos prêmios, inclusive o segundo lugar no famoso Prix de Rome, que dava aos jovens músicos a oportunidade de morar por três anos na Itália e aprender arte por lá (mas não ao segundo lugar, claro).
Além de compositor, Dukas era um afiado crítico musical e tornou-se um respeitado professor de composição no fim de sua vida.
Ele compunha muito, mas era perfeccionista (jogava fora suas partituras). Poucas obras nos sobraram, dentre as quais, a mais conhecida é O Aprendiz de Feiticeiro. Tem também uma Sinfonia em Dó Maior, que costuma ser gravada. Mas sua obra considerada mais sofisticada é o balé La Peri.
Em 1916 ele se casou com Suzanne Pereyra, com quem teria uma filha, Adrienne-Thérèse Dukas, em 1919.
O enredo
O balé narra uma história sobre Iskander (nome persa de Alexandre). Os Magi (sacerdotes do Zoroastrismo) haviam observado que sua estrela estava desaparecendo, e que isso significava que seu fim estava próximo. Iskander, então, parte em busca da Flor da Imortalidade. Depois de três anos procurando e vagando, ele chega ao fim da Terra (digamos que, nesse cenário, a Terra tem um fim, coisa que todos sabemos que não é verdade, certo?). Lá, ele encontra um templo de Ormuzd. Nos degraus está uma Peri - um ente análogo a uma fada, com asinhas e tudo, e de grande beleza.
Ela tem em suas mãos a Flor da Imortalidade, uma flor de lótus decorada com esmeraldas. Iskander espera que ela adormeça e, fazendo o maior silêncio possível, retira a flor de suas mãos. Mas a flor começa a brilhar nas mãos de Iskander, acordando Peri. Ela bate uma mão contra a outra e solta um longo grito, porque sem a flor ela não pode entrar no templo de Ormuzd.
Iskander parece se deliciar ao descobrir que tem um poder sobre a Peri. Mas, com a flor ainda nas suas mãos, o poderoso Ormuzd a transforma nos desejos materiais e mundanos de Iskander. Peri imediatamente entende que a flor não estava destinada a pertencer a Iskander. Ela faz uma dança, na qual vai se aproximando lentamente dele e o rouba a Flor da Imortalidade de volta.
Peri pode voltar ao paraíso, e Iskander percebe que sua vida chegou ao fim.
A orquestra
A orquestra comporta:
1 Flautim (alternando para terceira flauta)
2 Flautas
2 Oboés
1 Corne Inglês
2 Clarinetes
1 Clarinete Baixo (Clarone)
3 Fagotes
4 Trompas
3 Trompetes
3 Trombones
1 Tuba
Percussão: Tímpanos, bombo sinfônico, caixa clara, pratos, triângulo, pandeirola, xilofone e celesta
2 Harpas
Violinos 1
Violinos 2
Violas
Violoncelos
Contrabaixos
A música
Abaixo, a gravação que nos dará referência, com a Orquestra Estadual Nacionai Russa, regida por Evgeny Svetlanov.
Começa de maneira misteriosa, com pequenos sobressaltos da madeiras. Em algumas gravações e apresentações, tem uma Fanfarra que antecede o Balé. Não é o caso do vídeo acima.
Quero que reparem na orquestração comedida, porém bastante efetiva. O impressionismo é uma influência nessa peça, sem dúvida. As cordas tocam muito em tremolo. As texturas se confundem uma com a outra. Vez por outra uma dança eclode, fazendo o movimento ficar mais agitado.
A atmosfera é fantástica, com evocações ao sobrenatural. Ele faz uso de efeitos nas madeiras, cordas e percussões.
É, sem sombra de dúvida, uma partitura arrojada, tanto em sua orquestração quanto no fluxo de ideias. Não encontraremos com facilidade os temas principais. Temos, sim, momentos descritivos altamente expressivos.
Aliás, identificar os momentos da narrativa com as passagens musicais é tarefa árdua. Essa música poderia se servir a qualquer outro enredo. Tanto que o balé quase nunca é executado. A música é mais ouvida em salas de concertos e gravações. Em outras palavras, ao escutá-la, não busque saber em que parte da história você está. Desfrute-a como música pura, que descreve sentimentos e sensações diversos, mas sem ficar presa a um enredo.
Gravações importantes
- Leonard Slatkin, com a Orquestra Nacional da França - É uma das gravações mais importantes da peça. O som é excelente e a orquestra é sutil. É uma gravação de 1996.
- Antônio de Almeida, regendo a Orquestra Filarmônica Tcheca - De 1973, essa gravação é primorosa, com as variações de humor muito bem dosadas.
- Jesús López-Cobos, regendo a Sinfônica de Cincinnati - Uma gravação excepcional. López-Cobos não tem medo de arrebatar e a orquestra corresponde com prontidão. É de 1999.
- Ernest Ansermet, regendo a Orquestra do Conservatório de Paris - Seria a versão dos sonhos, não fosse pelo som. É um mono bom, mas não compete, em termos de sonoridadem à de Lópes-Cobos ou à de Slatkin. Mas a expressividade é quase surreal.
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