O conjunto dos 5 Concertos para Piano e Orquestra de Ludwig van Beethoven é um dos mais importantes da literatura musical. Os dois primeiros são da década de 1790, o começo da carreira do compositor, antes dos seus 30 anos. Nessa época, Beethoven ainda se encontrava no período clássico, e pode-se dizer até que imitava Mozart.
Depois ele viria a operar no romantismo, e, a cada concerto, surpreendia. Não se pode falar de sua obra sem mencionar as 9 Sinfonias, as 32 Sonatas, os 5 Concertos para Piano, o Concerto para Violino, os 16 Quartetos de Corda...
1º Concerto
O 1º Concerto na verdade foi composto em 1795, depois do segundo (mas publicado antes), sendo até um pouco evoluído em relação a este. Ele já tem vários elementos da personalidade musical de Beethoven. Especialmente nos ritmos martelados fora do tempo forte, na harmonia ousada e na orquestração grandiloquente.
O compositor deixou 3 opções de cadência para o primeiro movimento, o que não impede que o pianista componha a sua própria. O segundo movimento é lindo, reminiscente de Mozart, também. Já demonstrava a capacidade melódica dele. O último movimento é um Rondó também obediente ao classicismo, e também tem cadência.
Gravação recomendada: Martha Argerich, com a Orquestra de Câmara Mito (argh), sob Seiji Ozawa
2º Concerto
O 2º Concerto é anterior, datando de 1789, possivelmente. É o menos tocado dos 5, mas não é desprovido de charme. Na verdade é bem interessante e teve gravações importantes (o concerto menos gravado de Beethoven ainda é mais gravado que o mais gravado da maioria dos compositores). Antes, quando me vinha à memória a melodia do primeiro movimento, eu jurava que era de Mozart.
Menos emocional que o 1º, eu diria que é mais nobre. Sério, nessa de imitar o ídolo, ele fez um belo trabalho. Claro que quando você escuta com atenção, percebe que é Beethoven: um momento mais sombrio, uma variedade maior de dinâmica etc. Ele mesmo não gostava da peça: "não é das minhas melhores"... Mas compositores costumam ser críticos de suas obras mais bem sucedidas. A cadência do 1º movimento é brilhante, assim como no concerto anterior. O 2º movimento é sensacional, comovente. Melodicamente, em 4 dos 5 concertos, ele demonstrou sua capacidade plena nos segundos movimentos. No finale temos um Rondó cativante que termina a obra com brilho.
Gravação recomendada: Mitsuko Uchida, com a Filarmônica de Berlim, sob a direção de Simon Rattle
3º Concerto
O 3º Concerto é o adolescente. O começo do desprendimento de Beethoven dos seus antecessores clássicos. Aqui ele dá maior atenção aos sentimentos, pra colocar de forma simples. A música se torna muito mais poderosa, a intenção não é mais de fazer música que simplesmente gere deleite. É uma coisa especial. Composto por volta de 1800 e publicado em 1804, é uma obra que começa a pisar na nova corrente artística que varreria a Europa e da qual Beethoven seria um dos patronos: o romantismo.
Pra começar, ele é em tom menor. Bem mais sombrio e capaz de provocar sensações mais à flor da pele. Tem característica da segunda fase do compositor (são 3): arrebatamento através de explosões orquestrais, mudanças súbitas na harmonia, acentuações rítmicas inesperadas e uma orquestração muito mais colorida. Além da cadência voraz e absolutamente matadora no primeiro movimento. O concerto é um perfeito veículo para um pianista mostrar suas qualidades. Delicadeza e ternura no segundo movimento. Agilidade no terceiro. É uma das mais importantes obras do mestre alemão, e, embora ainda não seja tecnicamente romântica, já semeia o terreno.
Gravação recomendada: Martha Argerich, com a Orquestra de Câmara Mahler, sob a direção de Claudio Abbado
4º Concerto
Já completamente mergulhado no romantismo, o 4º Concerto é uma das obras mais bem acabadas e maduras de qualquer compositor, de 1806. Claramente não foi feito para impressionar, com sua estrutura um tanto caótica: o 1º movimento começa com o piano introduzindo um tema na tonalidade de sol, que é a tonalidade proposta pelo concerto. Mas a orquestra retoma o tema em si maior. O que é estranho. Daí, mal a orquestra faz uma exposição, o piano volta e eles continuam em perfeita harmonia, como se não houvesse duelo senão nas entrelinhas. A obra só não é confusa porque tem certeza de si. É assertiva e segura. E genial. O tempo todo somos surpreendidos.
Também não apresenta virtuosismo gratuito, isto é, exibicionismo de técnica por parte do piano. E lembra que eu disse que Beethoven desfila sua criatividade melódica nos movimentos lentos de 4 dos concertos? Pois aqui é a exceção. Não que o 2º movimento seja feio. Ele apenas não quer ser simplesmente belo. Sabe aquela modelo que insiste que é mais do que um rostinho bonito? É o caso. E é mais, mesmo. A melodia (ou como você quiser chamar) esconde uma profundidade que a gente só capta com muitas audições. A orquestra parece que vem com raiva e o piano responde sempre calmamente. Os dois quase não se encontram no movimento, quando um fala o outro cala. E os silêncios... Falam quase mais que a música.
O terceiro movimento é um Rondó alegre como se nada tivesse acontecido. Mas também não é vazio. Consegue ser triunfante sem fugir da proposta do concerto, que é mais soturna. Vários compositores fizeram cadências para esta obra, dentre eles o próprio Beethoven, Johannes Brahms, Feruccio Busoni e Camille Saint-Saëns.
Gravação recomendada: Alexis Weissenberg, com a Filarmônica de Berlim, sob a direção de Herbert von Karajan
5º Concerto - "Imperador"
O Imperador é o mais conhecido dos 5. De 1811, nessa época o compositor, muito provavelmente já estava completamente surdo. Tanto que não tocou na estréia, como de praxe.
O primeiro movimento começa com um acorde explosivo da orquestra seguido por uma breve candência do piano. E outra, e outra. Depois temos a exposição orquestral. O concerto é extremamente heróico, audacioso. Uma curiosidade é que ele não tem e, ao mesmo tempo, tem, uma cadência propriamente dita. A orquestra prepara, tocando o acorde da tônica com baixo na 5ª e para. Sabe-se que vem uma cadência. Mas o que vem é menor que uma, menos improvisativo, mais curto e menos virtuosístico. Mas, pra mim, é cadência.
O segundo movimento é um dos mais belos do compositor. Sereno, apresenta uma perfeita harmonia entre o piano solista e a orquestra. Também tem modulações arrepiantes. Ele desemboca direto no terceiro movimento, sem interrupções, um Rondó que, pra mim, é um tanto barulhento. Não gosto de coisas felizes demais, alegria em excesso é desespero.
Esse é provavelmente o concerto mais genial de Beethoven, embora alguns considerem o 4º mais satisfatório.
Abaixo vou deixar algumas sugestões de gravação dos 5 concertos em conjunto. São muitas gravações excepcionais, e eu selecionei apenas algumas. Estas foram gravadas em conjunto, com o mesmo regente, a mesma orquestra e o mesmo pianista nos 5 concertos. São as chamadas integrais dos concertos para piano de Beethoven. Se você não conhece nenhum, sugiro que começe pelo 5º.
- Alexis Weissenberg, com a Filarmônica de Berlim e o maestro Herbert von Karajan;
- Mitsuko Uchida, com a Filarmônica de Berlim, sob a batuta de Simon Rattle;
- Leif Ove Andsnes tocando e regendo a Orquestra de Câmara Mahler;
- Claudio Arrau, com a Orquestra do Concertgebouw de Amsterdã, sob Bernard Haitink;
- Nelson Freire, com a Orquestra do Gewandhaus de Leipzig, regida por Riccardo Chailly;
- Wilhelm Kempff, com a Filarmônica de Berlim, sob Ferdinand Leitner;
- Evgeny Kissin, Sinfônica de Londres, Colin Davis
- Leon Fleisher, com a Orquestra de Cleveland, sob George Szell
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