Temos pelo menos três grandes orquestras brasleiras com contratos de gravação importantes e internacionais: a Orquestra Sinfônica Estadual de São Paulo (OSESP), a Filarmônica de Minas Gerais e a Filarmônica de Goiás. Todas estão com um nível muito bom (a OSESP se destaca em mínimos detalhes).
O novo disco da Filarmônica de Goiás, sob a regência de Neil Thomson é uma jóia. São 2 Suítes Sinfônicas e Roda de Amigos, do compositor fluminense César Guerra-Peixe (1914-1993).
Guerra-Peixe era um compositor nacionalista, não tão famoso, mas tão importante quanto Villa-Lobos. Sua música tinha forte influência nordestina. É um dissidente, ainda bem, do dodecafonismo, uma das técnicas atonais e seriais mais rigorosas e, cá pra nós, quase sempre anti-musicais.
Depois, partiu para obras ritmicamente características do Brasil, mas sem ser "bandeiroso" (palavra que aprendi com o compositor Eugênio Leandro).
O Disco
Suíte Sinfônica nº1 "Paulista"
A Suíte Paulista tem 4 movimentos:
1. Cateretê - Peça altamente ritmada e de escrita orquestral brilhante;
2. Jongo - Também ritmada, porém mais sutil, apresenta os sopros da orquestra, muito bons, assim como a percussão;
3. Recomenda de almas - É uma múscia com viés sacro, as cordas fazem um canto monofônico respondido por acordes dissonantes. Aos poucos, vai ficando mais polifônica e densa. Música de primeira qualidade;
4. Tambu - Tambu é um Finale excepcional e brilhante. Mais uma vez a orquestração se destaca.
Roda de Amigos
Também tem 4 movimentos, cada um representando uma personalidade:
5. O rabugento - Ele representa quatro personalidades de maneira brilhante. O rabugento é representado pelo fagote, que assume um papel de destaque na orquestra;
6. O teimoso - O teimoso é representado pelo clarinete, que parece não se dobrar às ordens da orquestra;
7. O melancólico - O melancólico é o oboé, com sua sonoridade por vezes carente. A música é muito bem escrita, com as cordas em surdina. A melancolia do oboé vai afetando os outros instrumentos, vez por outra temos uma flauta ou um fagote melancólicos;
8. O travesso - Utilizando-se de recursos orquestrais, Guerra-Peixe não poderia atribuir o travesso a outro instrumento que não a flauta. Um movimento alegre, com um solo de flauta inportante.
Suíte nº 2 "Pernambucana"
Outra suíte curta, e também com 4 movimentos.
9. Maracatu - O ritmo do Maracatu pernambucano, bem diferente do solene Maracatu cearense;
10. Dança dos cabocolinhos - A dança meio frenética dos caboclinhos também tem uma orquestração dinâmica e envolvente;
11. Aboiado - O maior movimento do disco, com 7m25s, é uma peça introspectiva e muito criativa, fazendo uso de recursos como pizzicati, uso frugal de percussões, construção melódica primorosa (oboé, fagote, clarinete, trompa e violoncelos) e acordes mágicos. Aboiado, pelo que eu entendo, significa aboio, o chamado dos vaqueiros pelo gado do sertão. É um movimento exuberante e gravado com perfeição.
12. Frevo - Uma suíte pernambucana não poderia deixar de terminar com um frevo. Mas é um frevo estilizado e dinâmico, que ora lembra os frevos carnavalescos mais tradicionais, ora lembra que estamos em uma sala de concertos.
Considerações finais
A orquestra é excelente, eu confesso que não sabia e fico feliz que o Brasil esteja finalmente descobrindo o valor de se ter grandes conjuntos nas cidades. É uma opção cultural da maior importância, mas é mais que isso. A orquestra educa, cativa, cultiva e propaga cultura onde estiver. É um patrimônio. Parabéns à Filarmônica de Goiás.
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